Na vida
cristã, a prece vem em primeiro lugar. A prece é o sopro do espírito. Onde
existe a prece, o espírito está vivo; sem ela, o espírito é sem vida.
Colocar-se
diante de um ícone e se prosternar não é a prece, é apenas um atributo. Dizer
as orações de memória, lendo-as ou escutando-as – isto ainda não é a prece, é
apenas um modo de descoberta e de despertar. A prece em si consiste na aparição
em nosso coração de uma série de sentimentos piedosos, dirigidos um após outro
para Deus: sentimentos de nossa própria indignidade, de devoção, de
reconhecimento, de glorificação, de súplica, de contrição, de prosternação
ardente, e outros.
Todo nosso
cuidado está aí: encher nossa alma com todos esses sentimentos e com outros
idênticos, a fim de que o coração não permaneça vazio. Quando todos esses
sentimentos, ou apenas um deles, se encontrarem aí, e se lançarem em direção a
Deus, então nossa oração terá se tornado uma verdadeira prece; caso contrário,
não o terá sido ainda.
A prece, ou
impulso em direção a Deus, deve ser estimulada e firmada, ou, o que vem a dar
no mesmo, devemos educar em nós o espírito da prece.
O primeiro
procedimento para tanto consiste na leitura ou na escuta de nossas preces.
Leia, ou escute com atenção, e com toda certeza você despertará e sustentará a
subida da prece de seu coração até Deus, ou seja, você penetrará no seu
espírito, no espírito da prece.
Nas preces dos
Padres santos, uma poderosa força se coloca em movimento, e aquele que aí se
introduzir desenvolvendo toda sua atenção e sua perseverança a experimentará
sem dúvida alguma, pela lei da interação, na medida em que tiver aproximado do
conteúdo dessa prece seu próprio estado de espírito. Para que nossas preces constituam
um modo real de educar esta disposição, é indispensável realizá-las de tal modo
a que o pensamento e o coração acolham seu conteúdo.
Com esse
objetivo, eis aqui três procedimentos muito simples: não comece suas orações
sem antes ter se preparado convenientemente; não ore de qualquer jeito, mas com
atenção e sentimento; e ao terminar, não retome imediatamente suas ocupações.
Preparação
para a prece
Quando você se
dispuser a orar, qualquer que seja o momento escolhido, permaneça primeiro um
tempo tranquilo, assente-se ou dê alguns passos, e esforce-se para liberar seu
pensamento de toda preocupação ou objeto daqui de baixo. Depois reflita: quem é
aquele a quem você irá dirigi sua prece, e quem é você, que irá agora se
dirigir a ele; e desperte em sua alma o sentimento apropriado, um sentimento de
abnegação e de temor piedoso na presença de Deus dentro do seu coração. Nisso
consiste a preparação mínima, mas de um significado muito importante: manter-se
com piedade diante de Deus dentro do coração.
Este é o
início da prece, e um bom começo já é metade da tarefa realizada.
Observância
da prece – as preces lidas
Tendo assim se
preparado interiormente, coloque-se diante do ícone, faça um sinal da cruz e
uma prosternação, e comece suas preces habituais. Leia sem prece, penetrando
cada palavra, levando até o coração o sentido de cada palavra, e acompanhe tudo
isso com prosternações e persignações. Esta leitura frutífera da prece é
agradável a Deus. Aprofunde cada palavra e introduza seu pensamento no coração,
ou seja: “Purifique-se de toda mancha”, sinta o mal que existe em você, deseje
a pureza, e, com total esperança, peça-a ao Senhor. Você lê: “Seja feita a sua
vontade” e em seu coração você entrega completamente seu destino ao Senhor,
pronto a acolher de bom grado tudo o que ele lhe enviar. Você lê: “Perdoe as
nossas dívidas, assim como nós perdoamos os nossos devedores”, e em sua alma
perdoe tudo a todos, e então peça perdão ao Senhor por você. Se você agir assim
em cada versículo da prece, terá encontrado a oração correta. E para cumpri-la
o mais precisamente possível, eis o que você deve fazer:
1.
Tenha uma certa regra de preces, não muito
longa, a fim de poder realizá-la sem pressa, apesar de suas ocupações
habituais.
2.
No seu tempo livre, leia atentamente as orações
da sua regra, para compreender cada palavra delas e senti-las, a fim de
conhecer previamente o que você deve produzir em sua alma e em seu coração
diante de tal ou tal palavra, a fim de que seja fácil realizá-lo e
experimentá-lo no momento da oração.
3.
Se, no momento da prece, seu pensamento voar em
direção a outros objetos, esforce-se para se manter atento, e retorne ao
objetivo da prece; se novamente ele fugir, obrigue-o a retornar outra vez:
repita a leitura a partir do ponto em que deixou de sentir e compreender cada
palavra. Assim você desabituará seu pensamento da dispersão quando orar.
4.
Se uma palavra da prece exercer um efeito
poderoso sobre sua alma: detenha-se e não leia além desse ponto; permaneça
nesta passagem, com atenção e sentimento, alimente sua alma com ela ou com os
pensamentos que ela produzir, e não destrua esse estado enquanto ele não
desaparecer por si só: este é o sinal de que o espírito da prece começa a fazer
seu ninho em você, e esse estado é o meio mais seguro de educar e firmar este
espírito.
Depois
da prece
Quando você
terminar sua oração, não passe imediatamente para qualquer outra ocupação, mas
outra vez permaneça tranquilo por alguns momentos e reflita sobre o que acabou
de realizar e no que isto implica, salvaguardando em especial, depois da prece,
aquilo que teve um efeito marcante sobre você. A própria natureza da prece é
tal que se você orou corretamente, como se deve, você não sentirá necessidade
de se ocupar de seus afazeres: quem saboreou o mel não irá querer fel; provar
desta doçura da prece é o próprio objetivo da oração e, saboreando essa doçura
durante a oração, o espírito da prece vai se educando.
Se você seguir
esses poucos princípios, verá rapidamente o fruto de seus esforços. Toda oração
deixa na alma um rastro da prece; segui-lo fielmente com o mesmo método a fará
deitar raízes, e a perseverança no esforço enxertará nela o espírito da prece.
Este é o
início, o primeiro modo de educar em nós o espírito da prece! Ele está em
conformidade com sua destinação, que é a realização de nossas preces. Mas ainda
não é tudo, isto não é mais do que o começo da ciência da prece. É preciso ir
mais longe.
Ir
além: a prece pessoal
Tendo nos
habituado pelo espírito e pelo coração a nos dirigirmos a Deus com uma ajuda
exterior – os livros de oração – a seguir é indispensável ensaiar a própria
subida até Deus, a conseguir que a própria alma, por meio de um discurso por
assim dizer pessoal, entre numa conversação de preces com Deus e se transporte
até ele, se abra para ele, lhe confesse seu estado e o que ela deseja. É
preciso aprendê-lo. Como ter sucesso em tal ciência?
É verdade que
o hábito da oração, com piedade, atenção e sensibilidade, com o apoio do livro
de orações, leva até aí, pois a prece pessoal, cheia de santos sentimentos
através do livro de orações, começará por si mesma a se desenraizar do coração
para se dirigir até Deus. Entretanto, para isso existem também métodos
específicos que conduzem aos necessários bons resultados da prece.
Primeiro método:
o ensinamento que conduz a alma a se dirigir frequentemente a Deus é o
“pensamento de Deus”, ou a reflexão piedosa sobre as propriedades e ações
divinas – benevolência, justiça, sabedoria, onipotência, onipresença,
onisciência – sobre a criação e a providência, a salvação em Jesus Cristo,
sobre a graça e a palavra de Deus, os santos mistérios e o reino celeste.
Qualquer que seja o objeto sobre o qual você começará a meditar, ele preencherá
a alma sem falta com um sentimento de piedade em relação a Deus: ele
impulsionará diretamente a Deus o ser inteiro, e é por isso que é um meio mais
direto para habituar a alma a se lançar a Deus.
Quando você
tiver terminado suas orações, sobretudo pela manhã, sente-se e comece sua
meditação: hoje a respeito de uma, amanhã sobre outra das propriedades e ações
de Deus, e conduza sua alma à predisposição correspondente. Repita com São
Dimitri de Rostov: “Venha, santo pensamento em Deus, e mergulhemos na meditação
das grandes obras de Deus”. Permita assim que seu coração se comova e você
começará a derramar sua alma durante a prece. Não é um esforço muito grande, e
dará muitos frutos. Só é preciso querer e zelar. Comece, por exemplo, a
refletir sobre a benevolência divina e você se verá cercado dos efeitos
corporais e espirituais da misericórdia divina, e, cheio de reconhecimento,
você se prosternará diante de Deus; medite sobre sua onipresença e você descobrirá
que em toda parte você está diante dele e ele diante de você, e será impossível
a você não sentir um piedoso temor; medite sobre a verdade de Deus, e logo será
convencido de que nenhuma má ação permanecerá impune, e você se disporá,
seguramente, a se purificar dos pecados diante de Deus com o coração contrito e
arrependido; reflita sobre a onisciência divina, e você reconhecerá que nada do
que está em você escapa aos olhos de Deus, e certamente você se decidirá a ser
severo consigo mesmo e atento em todas
as coisas, a fim de não irritar a Deus, que a tudo vê.
Segundo
método: este método para educar a alma a invocar frequentemente a Deus
consiste em dedicar todas as nossas empresas, sejam grandes ou pequenas, à sua
glória. Pois se tomarmos como regra, conforme o Apóstolo[1],
tudo fazer – mesmo comer e beber – para glória de Deus, não apenas nos
lembraremos de Deus, como ainda estaremos atentos, em todas as circunstâncias,
para não agir mal e não irritar a Deus com alguma ação de nossa parte. Isso nos
obrigará a nos dirigirmos a ele com temor e a pedir a ele que sempre nos ajude
e nos esclareça. E como estamos em atividade quase sem parada, também sem
cessar dirigiremos preces a Deus, nos manteremos constantemente em orante
elevação de nossa alma a Deus. Assim ensinaremos nossa alma a se dirigir o mais
frequentemente possível a ele durante cada dia.
Terceiro
método: o terceiro método de educação de nossa alma consiste em habituá-la
a chamar por Deus a partir do coração, com palavras curtas, segundo as necessidades
e das ocupações. Ao iniciar qualquer coisa, diga: “Abençoa, Senhor”. Ao
terminar, diga, não apenas com a língua, mas com o coração: “Glória a ti,
Senhor!”. Se uma paixão ruim aparece, diga: “Salva-me, Senhor, estou em
perigo”. Invadido por uma multidão de maus pensamentos, chame: “Livra minha
alma da prisão”. Um engano surge num assunto e o pecado o chama, ore: “Guia-me,
Senhor, pelos caminhos”, ou “Não deixe meu pé escorregar”. Quando os pecados
pesam sobre você e o levam ao desespero, chame com as palavras do publicano:
“Senhor, tem piedade de mim”. E assim em todas as circunstâncias. Ou então,
diga com frequência: “Senhor, tem piedade”, “Mãe de Deus, Soberana, salve-me”,
“Anjo, meu santo Guardião, defende-me”, ou peça com quaisquer outras palavras.
Apenas, na medida do possível, chame constantemente, esforçando-se sobretudo
para que as palavras provenham do coração, como se brotassem dele. Fazendo
assim, obtemos frequentes elevações espirituais do coração para Deus,
chamando-o com frequência por meio de uma prece frequente, e esta frequência
nos inculcará o hábito da conversa espiritual com Deus.
Assim,
portanto, além da regra de orações, o aprendizado da elevação da alma para Deus
por meio da prece comporta também três procedimentos que nos conduzem ao
espírito da prece: deixar tempo pela manhã para a meditação de Deus, em tudo
trabalhar para a glória de Deus e se dirigir a Deus com frequência por meio de
curtos apelos. Quando a medição matinal de Deus for boa, ela preservará uma
disposição profunda do espírito para pensar em Deus. Este pensamento em Deus
obrigará a alma a cumprir todo ato, interior ou exterior, com prudência e para
a glória de Deus. E uma e outra a colocarão numa situação que a levará a fazer
constantes apelos curtos a Deus. Essas três coisas – meditação de Deus, toda
obra para glória de Deus e invocações frequentes – são as armas mais eficazes
para a prece espiritual do coração. Cada uma delas eleva a alma para Deus.
Desenraizando-se da terra, esta penetrará no seu domínio e viverá com delícia
nas alturas; aqui, por intermédio do coração e do pensamento; e lá em cima, ela
terá se tornado essencialmente digna de se colocar diante da Face de Deus.
Em momento de busca por silêncio interior, encontro estes ensinamentos preciosos de São Teófano, O Recluso, que preenchem e acalentam a minha alma. Gratidão imensa, em Paz e Bem!
ResponderExcluirMuito bom realmente, cada palavra soa com um tom de verdade muito grande e me levou a ir a um lugar mais profundo com o Senhor, grato pela vida de Teófano e por vocês.
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