Aquele que ama o Senhor se lembra constantemente dele, e a lembrança
de Deus faz nascer a prece. Se você não
se lembra do Senhor, tampouco irá rezar. Sem a prece, a alma não se manterá no
amor a Deus, pois é pela prece que nos chega a graça do Espírito Santo. Pela
prece, o homem se guarda do pecado, pois o espírito em estado de prece é
absorvido por Deus. Com humildade, ele se mantém diante da Face do Senhor, a
quem sua alma conhece (...).
Deus concede a prece a quem ora; mas a prece que realizamos unicamente
por costume, sem termos o coração quebrantado por causa de nossos pecados, não
é acolhida pelo Senhor.
Interromperei por um instante meus propósitos sobre a prece.
Minha alma desfalece diante do
Senhor; eu o busco com ardor e minha alma não suporta pensar em outra coisa.
Minha alma desfalece diante do Senhor vivo, e meu espírito se lança para ele
como para seu próprio Pai celeste. O Senhor nos une a ele pelo Espírito Santo.
O Senhor é doce ao meu coração – ele é nossa alegria, nossa felicidade e o
rochedo de nossa esperança. Senhor, em sua misericórdia venha em busca de sua
criatura, e mostre-se aos homens pelo Espírito Santo, como você se revela aos
seus servidores. Alegre, Senhor, com a vinda de seu Espírito Santo, toda alma
aflita. Faça, Senhor, com que todos os homens que oram conheçam o Espírito
Santo.
Nós, todos os homens, humilhemo-nos por amor ao Senhor e pelo Reino
dos Céus. Humilhemo-nos, e o Senhor nos fará conhecer a força da “prece de
Jesus”. Humilhemo-nos, e o próprio Espírito divino instruirá nossa alma.
Busque conselho junto a homens experientes, se os encontrar, e
interrogue humildemente o Senhor; por causa da sua humildade, o Senhor lhe
concederá a inteligência.
Quando nossa prece é recebida pelo Senhor, o Espírito divino dá
testemunho disto na alma; ele é doce e pacífico; de outro modo eu não saberia
se o Senhor aceitou ou não minha prece, nem por quais sinais reconhecê-lo.
Ó homem! Aprenda a humildade de Cristo, e o Senhor lhe permitirá
provar da doçura da prece. Se você busca a prece pura, seja humilde, seja sóbrio,
confesse-se sinceramente e a prece o amará. Seja obediente, submeta-se de bom
grado às autoridades, esteja contente com tudo e então seu espírito de
purificará dos vãos pensamentos. Lembre-se de que o Senhor o vê e tema ferir
seu irmão; não o julgue, não o faça sofrer, mesmo que só com a expressão do seu
rosto – e então o Espírito Santo o amará e o socorrerá em tudo.
O Espírito Santo é como uma mãe cheia de ternura. Assim como uma mãe
ama seu filho e o protege, também o Espírito Santo nos protege, nos perdoa, nos
cura, nos instrui, nos alegra; ele se dá a conhecer na prece realizada com
humildade.
Quem ama a seus inimigos conhecerá sem tardança seu Senhor por
intermédio do Espírito Santo; ao contrário, quem não os ama... Não quero nem
escrever a respeito. Apenas o lamento, pois este atormenta a si mesmo, faz
sofrer os outros, e não conhecerá o Senhor.
A alma que ama o Senhor não pode jamais deixar de orar, pois se sente
atraída para ele pela graça que conheceu através da prece.
As igrejas nos foram dadas para a prece; nas igrejas, celebramos os
ofícios de acordo com os livros litúrgicos; mas você não pode levar a igreja
consigo, nem está todo o tempo com os livros, enquanto que a prece interior
está sempre e em toda parte com você. Nas igrejas, celebramos os serviços
divinos, e o Espírito Santo está presente; mas a melhor igreja de Deus é a
alma. Para aquele que ora em sua alma, o mundo inteiro se torna um templo. Mas
isto não é concedido a todos.
Muitos homens oram com os lábios e gostam de orar apoiados nos livros
de oração. Isto é bom; o Senhor acolhe suas preces e derrama sobre eles sua
graça. Mas se oramos pensando em outra coisa, o Senhor não escutará nossa
prece. Quem ora apenas por hábito não experimenta as transformações de sua
oração, mas quem ora com todo o seu coração descobre logo as provas que advém:
ele se acha em luta contra o inimigo, em luta consigo mesmo, em luta com as
paixões, em luta com os homens; e, em tudo isso, é preciso ser valente e
valoroso.
Os sofrimentos e os perigos ensinaram muitos homens a orar. Um dia, um
soldado veio me procurar numa loja de víveres[1];
ele estava lotado em Salonica. Minha alma sentiu afeto por ele, e eu lhe disse:
“Ore ao Senhor, e suas penas serão aliviadas”. Ele me respondeu: “Eu sei rezar.
Eu aprendi durante a guerra, quando estava em batalha. Eu suplicava ao Senhor
que guardasse minha vida. Choviam balas, os obuses explodiam e poucos homens
sobreviveram; eu tomei parte de muitos combates, mas o Senhor me preservou”.
Falando assim, ele me mostrou como orava, e pela atitude de seu corpo podia-se
ver que ele estava inteiramente mergulhado em Deus.
Muitos homens gostam de ler bons livros, o que é bom; mas orar é
melhor do que tudo. Ao contrário, quem lê livros ruins ou jornais, é ferido com
a fome da alma. Sua alma se torna faminta, porque o alimento da alma e suas
delícias estão em Deus. É em Deus que encontram sua vida e sua alegria.
Se você deseja orar com o espírito unido ao coração, mas não o
consegue, diga a prece com os lábios e fixe sua atenção nas palavras da prece,
como disse São João Clímaco em sua Escada.
Com o tempo, o Senhor lhe concederá a “prece do coração”, sem distração, e você
poderá orar com facilidade. Alguns, na obra da prece, tendo forçado seu
intelecto a descer até o coração, o abismaram a tal ponto que já não eram mais
capazes de pronunciar a prece com os lábios. Mas você conhece a lei da vida
espiritual: os dons não são concedidos senão à alma simples, humilde e
obediente. A quem é obediente e contido em tudo – na alimentação, nas palavras
e nos movimentos – o Senhor concederá a prece, e ela se realizará com
facilidade em seu coração.
A prece incessante procede do amor, mas a perdemos por causa dos
julgamentos, das palavras vãs e da intemperança. Quem ama a Deus pode pensar
nele dia e noite, pois nenhuma ocupação pode impedi-lo de amar a Deus. Os
Apóstolos amavam o Senhor sem que os mundo os perturbasse, e mesmo assim eles
se lembravam do mundo, oravam por ele e por ele se entregavam à predicação.
Entretanto, foi dito a Santo Arsênio: “Fuja dos homens”; mas o Espírito divino
nos ensina, mesmo no deserto, a orar pelos homens e pelo mundo inteiro.
Neste mundo, cada qual tem uma tarefa: um é rei, outro é patriarca,
outro cozinheiro, ferreiro ou professor, mas o Senhor ama a todos os homens, e
aquele que é contemplado com um amor ainda maior de Deus receberá também uma
recompensa ainda maior. O Senhor nos deu o mandamento de amar a Deus de todo
nosso coração, de toda nossa inteligência e de toda nossa alma. Mas como é
possível amar sem orar? É por isso que o intelecto e o coração do homem devem
sempre estar livres para a prece.
Quando amamos alguém desejamos estar com a pessoa, pensar nela, falar
com ela. A alma ama o Senhor como seu Pai e Criador, e diante dele se coloca
com temor e amor; com temor, porque ele é o Senhor, e com amor, porque nele a
alma reconhece seu Pai. Ele é misericordioso, e sua graça é mais doce do que
tudo.
Também eu penso que é fácil orar, porque a graça de Deus nos auxilia.
O Senhor nos ama e nos permite conversar com ele na prece. Faltam-me forças
para descrever o quanto o Senhor nos ama. Conhecemos este amor por intermédio
do Espírito Santo, e a alma de quem ora conhece o Espírito Santo.
Alguns dizem que a prece nos faz cair numa ilusão espiritual, mas isso
é um erro. A ilusão provém de uma presunçosa confiança em si próprio, não da
prece. Todos os santos oraram muito e chamaram os demais homens à prece. A
prece é a melhor atividade para a alma. Por meio dela, chegamos até Deus; por
meio dela, pedimos a humildade, a paciência e outros bens. Quem fala contra a
prece claramente jamais provou o quanto o Senhor é bom. Nenhum mal provém de
Deus. Todos os santos oraram sem cessar; eles não permaneciam um só instante
sem a prece.
A alma, ao perder a humildade, perde também a graça e o amor a Deus, e
então a prece ardente se extingue; mas quando as paixões se apaziguam na alma,
esta readquire a humildade e o Senhor lhe concede sua graça. A partir daí, ela
ora por seus inimigos como por si própria, e ora pelo mundo inteiro com
lágrimas ardentes.
[1]
São Silouane era ecônomo do mosteiro de São Panteleimon, responsável pelos
questões materiais do mosteiro.
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