TERCEIRA CENTÚRIA
CAPÍTULOS GNÓSTICOS
Do amor e da perfeição da vida
1. Deus é o intelecto impassível além de toda inteligência e de toda
impassibilidade. Ele é Luz, e fonte da boa luz[1].
Ele é Sabedoria, Razão e Conhecimento, e dispensador da sabedoria, da razão e
do conhecimento. Aqueles aos quais, por sua pureza, foram concedidas estas
coisas, em quem as podemos ver em abundância, estes guardam em si a imagem de
Deus, com a qual se recobriram, pois a partir daí se tornaram filhos de Deus
conduzidos pelo Espírito, conforme foi dito: “Aqueles a quem o Espírito de Deus
conduz, estes são de Deus[2]”.
2. Todos aqueles que, por meio das penas da ascese, se purificaram das
manchas da carne e do espírito[3],
se tornaram cálices da natureza imortal pelos carismas do Espírito. Tendo
chegado até aí, eles se veem cheios da boa luz. Desde então estão em paz, o
coração repleto de calma, e proferem as boas palavras[4],
a sabedoria de Deus escorre de seus lábios no conhecimento das coisas divinas e
humanas. Nada pode turbar o que dizem quando expõem as profundezas do Espírito.
Para estes homens já não existe lei[5].
Eles estão definitivamente unidos a Deus, e a boa transformação os transformou[6].
3. Aquele que, com seu fervor, tende para o divino sem evitar sua
pena, se torna pelas virtudes da alma e do corpo a marca de sua imagem. Por
osmose, ele próprio repousa em Deus e Deus repousa nele, de tal modo que, na
superabundância dos carismas do Espírito, ele se torna e se mostra agora como a
imagem da beatitude divina e Deus por adoção, e Deus é o iniciador de sua
perfeição.
4. O homem não foi feito à imagem de Deus pela estrutura orgânica do
corpo, como se pode pensar levado pela ignorância. Ele o é pela natureza
intelectual da inteligência, que não é limitada pelo corpo que pesa para baixo.
Com efeito, assim como a natureza divina não é limitada – pois ela está fora de
toda criação, de toda densidade, sendo infinita e incorpórea, além de toda
essência e de toda razão, incriada, intangível, fora de qualquer quantidade,
invisível, imortal, incompreensível, inteiramente inconcebível por nós – também
a natureza intelectual que Deus nos deu não tem limites e está fora de qualquer
densidade, sendo incorpórea, invisível, intangível, incompreensível, imagem de
sua glória eterna e imortal.
5. Deus é a primeira Inteligência. De fato, ele é o Rei do universo.
Ele contém em si o Verbo consubstancial e eterno com o Espírito. Ele jamais
esteve fora do Verbo e do Espírito, pois sua natureza é indivisível. E ele não
se confunde com eles, pois a distinção das hipóstases nele não permite a
confusão. A partir daí ele engendra naturalmente o Verbo a partir de sua essência
sem se separar dele, porque continua indivisível. O Verbo eterno com ele tem a
mesma natureza sem começo do Espírito, o qual procede do Pai[7]
antes de todos os séculos. Também ele não se separa daquele que o engendrou.
Pois a natureza de um e de outro é uma e indivisível, ainda que se apresente
dividida em pessoas pela distinção das hipóstases. Ela é glorificada na
Trindade do Pai, do Filho e do Espírito Santo. E jamais estas Pessoas, que são
uma só natureza e um só Deus, podem ser separadas da essência e da natureza em
sua única eternidade. Contemple assim o ícone desta natureza única em três
Pessoas. Contemple-a no homem que ela formou. Contemple-a no espiritual, mas
não no visível, no imortal que é sempre o mesmo, mas não no mortal que se
dissolve.
6. Da mesma forma como Deus, que é Inteligência muito além das
criaturas por ele formadas na sabedoria, engendra independente de qualquer
escoamento ou fluxo o Verbo em sua permanência e envia com seu poder, conforme
está escrito[8], o
Espírito Santo que está fora e além de tudo, também o homem, que participa de
sua natureza divina, que, dentro de sua alma intelectual, incorpórea e imortal,
é uma imagem sua em espírito, e cujo intelecto engendra naturalmente e por sua
essência a razão por meio da qual todas as potências do corpo estão guardadas,
está fora e no interior da matéria e dessas coisas visíveis. E do mesmo modo
como aqueles são inseparáveis de suas hipóstases – vale dizer, do Verbo e do
Espírito – também ele, em sua alma, não pode ser cortado do intelecto e da
razão, da natureza única e da essência que não é limitada pelo corpo.
7. O divino é adorado em três hipóstases no Pai, no Filho e no
Espírito Santo. E devemos considerar que a imagem que ele formou – o homem –
também está dividida em três partes. Pela alma, o intelecto e a razão o homem
adora a Deus que criou tudo a partir do nada. Aquilo que por natureza é eterno
com Deus e consubstancial a ele é, assim, da mesma natureza e da mesma
substância que sua imagem. É desta forma que a imagem se torna visível em nós.
E é assim que eu sou imagem de Deus, mesmo tendo sido feito de uma mistura de
argila e imagem.
8. Uma coisa é a imagem de Deus, e outra aquilo que vemos nesta
imagem. A imagem de Deus é a alma intelectual, o intelecto e a razão: a
natureza única e indivisível. Aquilo que vemos na imagem é a soberania, a
realeza, a liberdade. Assim, uma coisa é a glória do intelecto e outra sua
dignidade. Uma é a criação “à imagem” e outra a criação “à semelhança”[9].
A glória do intelecto é a elevação, o movimento contínuo para o alto, a
sutileza, a pureza, a consciência, a sabedoria, a imortalidade. Sua dignidade é
a razão, a realeza, a soberania, a liberdade. A criação à imagem de Deus
significa o caráter pessoal, consubstancial, indivisível e inseparável da alma,
do intelecto e da razão. O intelecto e a razão estão ligados à alma incorporal,
imortal, divina e intelectual. Estas são coisas consubstanciais na mesma
eternidade, que não podem ser jamais separadas nem divididas. A semelhança é a
justiça, a verdade, a misericórdia, a compaixão, o amor pelos homens. Naqueles
que cumprem e guardam estas coisas, a imagem e a semelhança se revelam
claramente: elas são evidentemente animadas pela natureza, mas estão acima das
outras pela dignidade.
9. A alma dotada de razão se divide em três partes. Mas também podemos
distinguir nela duas partes: uma parte racional e outra passional. A parte
racional, à imagem daquele que a criou, não é relativa a nada, não pode ser
vista nem definida pelos sentidos, estando simultaneamente dentro e fora
destes. Por meio da razão, a alma se comunica com as divinas potências
intelectuais. Por meio do santo conhecimento dos seres, ela se eleva
naturalmente para Deus como para seu modelo e desfruta de sua natureza divina.
Mas a parte passional é dividida, submetida aos sentidos, às paixões, ao
relaxamento. Por meio da paixão, a alma se comunica com a natureza sensível
ligada ao alimento e ao crescimento, e se liga ao ar, ao frio e ao calor, aos
alimentos, para assegurar a subsistência, a vida, o crescimento e a saúde.
Alterada por estas coisas, a parte passional tanto deseja sem razão, levada
pelo movimento natural, quanto se exacerba, levada por um ardor irrefletido, e
suscita a fome, a sede, a tristeza, a pena e finalmente a dissolução. Ela se
regozija com aquilo que a contenta e é deprimida pelas aflições. É com justiça
que a denominamos passional, pois ela é absorvida pelas paixões. Quando esta
parte mortal é absorvida pela vida do Verbo[10],
quando vence o mais forte, então a vida de Jesus aparece também na nossa carne
mortal[11],
trazendo para nós a morte vivificante da impassibilidade, e nos concede a
herança incorruptível da imortalidade no desejo do Espírito.
10. Assim como o Criador do universo, antes de fazer tudo a partir do
nada, continha em si o conhecimento, as naturezas e as razões de todos os
seres, sendo ele o rei dos séculos e sabedor de tudo por antecipação, também
ele concedeu ao homem formado à sua imagem, para que se tornasse o rei da
criação, possuir em si as razões, as naturezas e o conhecimento de todos os
seres. Por sua criação o homem possui em si da terra a secura e a frialdade dos
tecidos do corpo; do ar e do fogo, o calor e a umidade do sangue; da água, a
umidade e o frio dos humores; das plantas, o crescimento; dos seres vivos, o
modo de se alimentar; dos animais selvagens, seu estado de paixão; dos anjos, a
vida dotada de inteligência e de razão; de Deus, o sopro imaterial, a alma
incorpórea e imortal que vemos no intelecto, na razão e no poder do Espírito
Santo, que o faz ser e viver.
11. É pela virtude e o conhecimento que nos assemelhamos a Deus que
nos formou à sua imagem e semelhança[12].
Pois sua virtude cobre os céus, e a terra está plena de seu conhecimento[13].
A virtude de Deus consiste na justiça, na santidade e na verdade. É o que disse
Davi: “Você é justo, Senhor, e sua verdade me envolve[14]”.
E também: “O Senhor é justo e santo[15]”.
Também nos assemelhamos a Deus pela retidão e a bondade. “Pois o Senhor é bom e
direito[16]”.
Assemelhamo-nos a ele pela palavra de sabedoria e a palavra de conhecimento.
Pois todas estas coisas estão nele, e ele é chamado de Sabedoria e Verbo.
Assemelhamo-nos a ele pela santidade e a perfeição, conforme ele próprio disse:
“Sejam perfeitos, como seu Pai celeste é perfeito[17].
Sejam santos, como eu sou santo[18]”.
E nos assemelhamos a ele pela humildade e a doçura, pois ele disse: “Aprendam
comigo que sou manso e humilde de coração, e vocês encontrarão a paz em suas
almas[19]”.
12. Sendo nosso intelecto à imagem de Deus, naturalmente ele possui em
si esta imagem, na medida em que ele permanece naquilo que lhe é próprio e não
se afasta de sua dignidade e de sua natureza. É por isso que de alguma maneira
ele deseja permanecer nas coisas de Deus, que ele busca se unir a ele, de quem
ele extrai sua origem, devido a quem ele se move, para quem ele tende por todas
as suas qualidades naturais, e por isso também ele deseja imitá-lo em seu amor
ao homem e sua simplicidade. Pois ele próprio engendra o Verbo, e recria como
se fossem outros céu as almas de seus companheiros. Ele os afirma pela
paciência das virtudes ativas. Ele os traz à vida pelo sopro de sua boca[20].
Ele lhes dá a força para combater as paixões destruidoras. Imitando com justiça
a seu Deus, ele próprio aparece como autor da criação espiritual e de todo o
resto. E ele escuta claramente, vindo do alto: “Aquele que separa o digno do
indigno será como minha boca[21]”.
13 Quem persevera nos movimentos naturais do intelecto e na dignidade
da razão se guarda puro de matéria, se adorna de doçura, de humildade, de amor,
de compaixão, e se cobre de luz sob o flamejamento do Espírito Santo. Voltado
para as mais altas contemplações, ele penetra no conhecimento dos mistérios
ocultos de Deus e se coloca, em seu amor pelo bem, a serviço daqueles que, por
sua sabedoria, podem escutar essas coisas. Ele não multiplica o talento[22]
apenas para si, mas ele transmite seu usufruto para aqueles que estão próximos
de si.
14. Quem se eleva acima da dualidade, que liberta desta dualidade a
nobreza do um, encontrou dentre os espíritos imateriais a vida fora da matéria
e se tornou um espírito dotado de intelecto, mesmo que o vejamos viver num
corpo no meio dos outros homens.
15. Aquele que, pela dignidade e a natureza do um submeteu a dualidade
à servidão, submeteu a Deus toda a criação, reuniu no um o que estava separado
e pacificou todas as coisas[23].
16. Enquanto a natureza das potências que se encontram em nós não for
ordenada, enquanto ela estiver dividida em múltiplos desacordos, não teremos
ainda parte nos dons sobrenaturais de Deus. Ora, se não tivermos parte nestes,
estaremos ainda longe da hierurgia[24]
do altar celeste, que é cumprida pela obra intelectual da inteligência. Mas
quando, pelo longo esforço dos combates sagrados, nos purificamos da malícia
ligada à matéria, quando, pelo poder do Espírito reunimos no um tudo o que nos
divide, então teremos parte nos bens secretos de Deus, seremos dignos de
oferecer a Deus o Verbo os mistérios divinos da hierurgia mística do intelecto
no altar mais que celeste e espiritual de Deus, pois seremos os iniciados e os
sacerdotes de seus mistérios imortais.
17. A carne deseja contra o espírito, e o espírito contra a carne[25].
Existe entre os dois uma guerra implacável. Um deve vencer o outro e dominá-lo.
Esta divisão presente em nós se denomina sublevação, impulso, jugo, duelo
selvagem. Ele divide a alma, no mesmo ponto em que o intelecto dá seu impulso a
um ato de paixão humana.
18. Enquanto formos divididos pela inconstância dos pensamentos e a
lei da carne nos dominar e perdurar em nós, estaremos dispersos em numerosos
pedaços de nós mesmos e seremos rejeitados para longe da unidade divina, pois
não nos enriquecemos desta unidade. Mas quando nosso ser mortal é engolido[26]
pelo poder unificante e pela ausência sobrenatural de preocupações, quando o
intelecto, dominando a si mesmo, se ilumina com os esplendores e os pensamentos
que o enchem de sabedoria, a alma, toda enovelada na unidade como Deus,
encontra o um ao invés das múltiplas divisões. Recolhida na unidade divina, ela
se vê unificada na simplicidade, à imitação de Deus. Tal é o restabelecimento
da alma em seu estado ancestral. E esta é a renovação que nos leva ao melhor.
19. A ignorância é uma calamidade e mais do que uma calamidade. Ela é
verdadeiramente uma treva palpável[27].
Ela obscurece as almas nas quais se encontra. Ela divide profundamente o
pensamento e impede a alma de se unir a Deus. Tudo o que se junta a ela é
desordem e ausência de razão. Pois ela torna o homem inteiro irracional e
insensível. Mas, do mesmo modo como a ignorância, ao se espalhar e se tornar
mais espessa, se torna para a alma que lhe está submetida um abismo infernal
onde se encontram todos os tormentos, todas as dores, as tristezas, os gemidos,
também o conhecimento de Deus, do qual podemos dizer que é uma fonte radiante e
infinita de luz, torna divinamente luminosas as almas nas quais se encontra
pela pureza. Ela as enche de paz, de calma, de alegria, de sabedoria inefável e
de amor perfeito.
20. A presença da luz divina é simples e una. Ela recolhe em si as almas
que a recebem e depois retorna a si mesma. Ela as une à sua unidade. Ela as
torna perfeitas com sua perfeição. Ela conduz pelas profundezas de Deus a visão
de sua inteligência. Ela lhes permite contemplar os grandes mistérios. Ela as
inicia e as torna aptas a iniciar. Assim sendo, procure se purificar a fundo
por suas penas, e você verá em si claramente a energia destas palavras, a
energia amada por Deus.
21. Os flamejamentos da luz primordial que penetram pelo conhecimento
nas almas purificadas não apenas as tornam boas e luminosas, como as conduzem
pela contemplação natural aos céus espirituais. Assim os efeitos da energia não
permanecem aí dentro das almas, mas se exercem até que, pela sabedoria e o
conhecimento dos mistérios inefáveis as almas se unem ao um, e, de múltiplas
que eram, se tornam uma com ele.
22. É preciso em primeiro lugar nos desembaraçarmos das misturas e
confusões por meio da ordem purificadora, longe do mal que liga à matéria os
inteligíveis, para depois termos os olhos do intelecto cheios de luz e sempre
claros graças à outra ordem, a ordem iluminadora que se realiza através da
sabedoria mística oculta em Deus; e se elevar assim em direção à ciência dos
conhecimentos sagrados que, pela palavra divina, concede o novo e o antigo[28]
àqueles que têm ouvidos; enfim, transmitir os sentidos místicos e ocultos desta
ciência, comunicando-os aos entendimentos que ninguém profana, afastando-o dos
imperfeitos, a fim de não entregar aos cães o que é santo e de não atirar a
pérola do Verbo às almas que são como porcos[29]
e que a mancharão.
23. Quando alguém percebe que o fervor de sua alma se dilata na fé
interior e no amor a Deus, saiba que ele traz em si a Cristo que eleva sua alma
da terra e das coisas visíveis e prepara nos céus sua morada. Quando ele vê seu
coração se encher de alegria e desejar com compunção dos bens secretos de Deus,
saiba que então o Espírito divino age nele. Enfim, quando ele sentir seu
intelecto cheio de luz inefável e da mais profunda sabedoria dos pensamentos,
saiba que o Consolador está em sua alma e que ele vem visita-lo para lhe
revelar os tesouros do Reino dos céus nele ocultos. Então, que ele se guarde
cuidadosamente, como um palácio de Deus e uma morada do Espírito.
24. A guarda dos tesouros ocultos do Espírito detém as coisas humanas,
o que consiste propriamente naquilo a que chamamos de hesíquia. Esta, pela
pureza do coração e a compunção longe de qualquer prazer, ilumina cada vez mais
o desejo do amor de Deus, liberta a alma dos laços dos sentidos e a convence a se
libertar dos modos habituais de viver. Quando ela traz de volta assim as
potências da alma, ela as devolve ao que elas são por natureza,
restabelecendo-as em seu estado original para que nenhum mal, proveniente da
alteração da imagem e de seu movimento para o pior, venha a se opor ao criador
dos bens.
25. É por esta perfeição sagrada, por esta perfeição divina que traz
numa luz benfazeja a hesíquia bendita e sacra, que praticamos e buscamos como
se deve. Mas se este grau de elevação e de perfeição ainda não foi alcançado,
aquele que parece viver em estado de hesíquia ainda não repousa na perfeita
hesíquia do intelecto. Na medida em que ele ainda não alcançou esta altura, ele
não repousa na hesíquia, longe da tempestade interior das paixões indomáveis.
Ele não terá mais que seu corpo rodeado de muros, buracos e cavernas, esgotado
por um intelecto desordenado e errante.
26. As almas que alcançaram um grau extremo de pureza e que chegaram a
uma grande altura de sabedoria e de conhecimento assemelham-se aos querubins
por se aproximarem de maneira, por assim dizer, imediata, por sua ciência, da
fonte dos bens. Então elas recebem com toda pureza a revelação da visão direta,
da qual apenas as potências dos querubins, diante de tal Tearquia[30],
são profunda e imediatamente iluminadas, como foi dito, na mais alta
intensidade das contemplações divinas[31].
27. Da mesma forma como as primeiras potências do alto são, umas, as
mais ardentes e vívidas envolvendo as coisas de Deus, com seu movimento
contínuo que não tem fim, e outras, as mais dotadas de visão, de conhecimento e
de sabedoria, cujo estado divino as coloca sempre em movimento ao redor das
coisas de Deus, também tais almas são mais ardentes e vívidas em envolver o
divino, dotadas de sabedoria, de conhecimento e da maior tensão nas
contemplações místicas. Um mesmo poder e um mesmo estado divino as conduzem.
Desta forma, seu movimento em torno das coisas de Deus é contínuo, seu
fundamento e sua morada são firmes. Por outro lado, elas recebem as
iluminações, neste estado em que participam do Ser e transmitem às outras
almas, abundantemente, pela palavra, as efusões de sua luz e de suas graças.
28. Deus é Inteligência, e causa do movimento contínuo do universo.
Todas as inteligências têm nele, a primeira Inteligência, seu ponto fixo e seu
movimento infinito. É isto que experimentam todos os que, pelos santos suores,
têm neles o movimento, não material e misturado, mas sem mescla e sem confusão.
Eles o experimentam no ardor de seu amor divino, comunicando entre si e consigo
mesmos os flamejamentos irradiados pela Tearquia que concede o bem e a
sabedoria dos mistérios do Deus oculto a eles, transmitindo-os amorosamente aos
demais e neles celebrando o amor a Deus que não tem fim.
29. As almas que tornaram em si leve a razão desembaraçada da matéria
são móveis e giram ao redor de Deus. Da dualidade que combate a si própria em
todas as coisas elas fizeram a dócil rédea que conduz aos céus. Elas gravitam
sem fim ao redor de Deus, como que tensionadas para o centro e a causa do movimento
circular. E elas são imóveis, estáveis e firmes, mirando o centro sem poder se
desligar dos laços que as unem para voltar às sensações a ao erro das coisas
humanas lá em baixo. Esta é a finalidade perfeita da hesíquia, para onde são
levados os que a vivem verdadeiramente. Arrebatados pelo movimento, eles
permanecem imóveis. Estáveis e imóveis, eles giram ao redor do divino. Enquanto
não chegarmos a este ponto, apenas parecemos viver na hesíquia, mas é
impossível que nosso intelecto saia da matéria e da errância.
30. Quando, com toda atenção e fervor, retornamos à beleza original da
razão, quando, com a chegada do Espírito, tomamos parte na sabedoria e no
conhecimento que nos são concedidos desde o alto, então se revela a nós, que
podemos vê-la claramente, sábia e bela, a fonte primordial, a causa primeira da
criação de todos os seres. Ela não traz a nós nada que a acuse, nada
proveniente da malícia que nos destrói, quando, contra nossa vontade, nos
desvia para o pior. Quando aquilo que é separado transborda, quando escapa da
beleza original, quando decai da deificação, a fonte, caída em semelhante
divisão, engendra sua forma desprovida de toda razão.
31. O único e primeiro fundamento dos que tendem para o progresso é o
conhecimento dos seres que adquirem por meio da filosofia ativa. O segundo é o
conhecimento dos mistérios ocultos de Deus no qual são iniciados pela
contemplação natural. O terceiro é a aproximação da luz original e a união com
ela, onde se encontra o repouso de todo progresso filosófico e de toda
contemplação.
32. Todas as inteligências evoluem por si próprias, para si mesmas e
para o Ser em si. Elas são conduzidas numa mesma e única forma através destes
três modos. Elas iluminam seus próximos, os iniciam nos mistérios de Deus e os
conduzem à perfeição por meio da sabedoria do céu, como espíritos purificados,
unindo-os a elas e à Unidade.
33. A deificação em vida é a verdadeira hierurgia espiritual e divina
por meio da qual é celebrado o Verbo da sabedoria misteriosa e pela qual ele é
transmitido àqueles que para tanto se prepararam na medida do possível. Por
toda sua bondade Deus a concedeu do alto à natureza racional na unidade da fé.
Assim alguns, graças à sua pureza, receberam esta recompensa pelo conhecimento
do divino e se tornaram semelhantes a Deus, em conformidade com a imagem de seu
Filho[32],
por seus altos movimentos intelectuais em redor das coisas divinas, e se
tornarão por adoção como deuses em relação aos demais homens sobre a terra.
Outros, pela purificação, através de sua razão divina e da santa união, perfazem
a si mesmos na virtude. Na medida de seu próprio progresso e de sua própria
purificação, eles participam da deificação dos primeiros e comungam com eles na
união divina, até que todos, unidos no Um, recolhidos todos na unidade do amor,
sem fim se unem ao único Deus. E Deus estará no meio de deuses[33],
criador das boas obras, Deus por natureza ao meio de deuses por adoção, nada
trazendo da criação que o possa acusar.
34.O homem que se devota à virtude não pode se tornar semelhante a
Deus – na medida em isto nos é permitido – se não começar por se desfazer, pelo
calor das lágrimas, do peso do lodaçal dos vícios que roubam a luz e se não se
agarrar à hierurgia dos santos mandamentos de Cristo. Pois de outra forma é impossível participar
dos bens secretos de Deus. Aquele que deseja provar em espírito da doçura
divina e do prazer das coisas espirituais deve se afastar de toda sensação do
mundo e, por seu impulso em direção aos bens reservados aos santos, engajar
continuamente sai alma na contemplação dos seres.
35. Manter em si imutável a semelhança divina que nos é dada pela
extrema purificação e um grande amor a Deus só é possível numa elevação
contínua em direção a Deus e numa tensão do intelecto mais contemplativo, tensão
que nasce naturalmente na alma a partir da perseverante hesíquia das virtudes,
da prece contínua, imaterial e calma, da temperança em tudo e da leitura
assídua das Escrituras.
36. É preciso se esforçar não apenas para atingir a paz das potências
que existem em nós, mas para alcançar o desejo do repouso intelectual. Este é
capaz de, na calma, fazer repousar sobre o bem todo o impulso dos pensamentos
e, por meio do orvalho divino que vem do céu, curar e refrescar o coração
ferido no fogo enviado do alto e atiçado pelo Espírito.
37. A alma ferida profundamente pelo ardente amor a Deus, depois de
haver provado a doçura de seus dons inteligíveis, já não pode se deter
inteiramente sobre si mesma, nem permanecer no lugar sem tender para diante
rumo aos degraus que sobem aos céus. Pois quanto mais ela avança pelo Espírito
em suas elevações e mais penetra nas profundezas de Deus, mais ela é inflamada
pelo fogo do impulso, descobrindo a imensidão de seus mistérios sempre mais
profundos, e apressando-se em se aproximar do fogo benfazejo, no qual se detém
todo desenvolvimento do intelecto, a fim de conhecer na felicidade do coração o
fim de suas próprias carreiras.
38. Quando alguém entra em comunhão com o Espírito Santo, quando
descobre em si, por uma energia e um perfume inefáveis, que o Espírito o
visitou, este homem já não se resigna daí por diante em permanecer dentro dos
limites da natureza. Transformado pela boa transformação da direita do
Altíssimo[34],
ele esquece alimento e sono, ele despreza as coisas do corpo, já não pensa no
descanso corporal e, mesmo que passe o dia em penas e suores ascéticos, não
sente nenhuma fadiga, nenhuma necessidade natural, nem fome, nem sede, sem
sono, nem qualquer outra necessidade da natureza. Pois o amor de Deus se
espalhou invisivelmente com uma alegria inefável em seu coração[35].
Perseverando toda a noite à luz do fogo, ele trabalha na obra do intelecto
exercitando seu corpo e desfruta das delícias do festim da eternidade e da
imortalidade das plantas do Paraíso inteligível. Foi quando se viu elevado a
este Paraíso que Paulo escutou as palavras inefáveis[36]
que o homem afetado pela sensação do visível não consegue ouvir.
39. Uma vez inflamado pelo fogo da ascese e batizado na água das
lágrimas o corpo já não se cansa quando pena, mas repousa no suor, pois ele
evidentemente está acima dos esforços da ação. Recebendo do interior da alma a
calma e o silêncio da paz, ele antes se enche de outro poder, de outra tensão,
de outra força do Espírito. Depois de haver assim enriquecido o corpo que mora
consigo, e erguido o estado deste acima do exercício corporal, a alma transfere
os movimentos naturais para os combates do intelecto e trabalha resolutamente
nesta obra. Ela guarda para si própria os frutos das plantas imortais no
Paraíso inteligível, donde escorre em rios a fonte dos pensamentos divinos, e
onde habita a Árvore do conhecimento de Deus carregada com os frutos da
sabedoria, da alegria, da paz, da doçura, da bondade, da paciência e do amor
inefável[37].
Trabalhando e guardando[38]
com tal fervor, ela emigra do corpo e penetra na treva da teologia. Ela se
coloca fora do universo. Nada do que é visível a retém. Unida a Deus, ela
repousa de seus suores e de seu desejo.
40. A razão nos diz, a nós que nos devotamos à virtude: de tudo o que
está em nós, o que é mais alto, o visível ou o inteligível? Se for o visível,
não preferiremos nem amaremos nada tanto quanto as coisas que passam e nossa
alma não será mais forte do que nosso corpo. Mas se for o inteligível, Deus é
Espírito, e os que o adoram devem adorá-lo em espírito e verdade[39].
Assim o exercício corporal é supérfluo[40]
quando a obra intelectual da alma é suficientemente forte, tornando leve o que
a puxa para baixo e tornando tudo espiritual, unindo tudo ao melhor.
41. Existem três ordens entre aqueles que avançam nos degraus que
sobem rumo à perfeição: a ordem da purificação, a ordem da iluminação e a ordem
da união mística que leva à perfeição. A primeira é a dos noviços. A segunda, a
dos médios. A terceira, a dos perfeitos. Pois, subindo pela ordem estes três
degraus, quem se devota à virtude cresce até alcançar o talhe de Cristo, até se
tornar um homem perfeito na medida da plenitude de Cristo[41].
42. A ordem da purificação é a dos noviços que se engajam nos combates
sagrados. Sua natureza própria consiste na rejeição da forma do homem
terrestre, na libertação de toda malícia material: ela nos faz revestirmo-nos
do homem novo, renovado pelo Espírito Santo[42].
Sua obra é o desprezo da matéria, o esgotamento da carne, a fuga para longe de
tudo o que incita à paixão a nossa porção racional e o arrependimento das
faltas passadas. Por outro lado ela nos permite lavar em lágrimas o amargor do
pecado, regrar nossa conduta sobre a bondade do Espírito, purificar pela
compunção o interior da taça[43],
ou seja, do intelecto, de toda sujeira da carne e do espírito[44],
para em seguida verter nela o vinho da razão que alegra o coração do homem[45]
purificado, e levá-la ao Rei dos espíritos para que ele a experimente, enfim,
ela nos permite consumir efetivamente no fogo da ascese e nas penas dos
combates, rejeitar todo veneno do pecado, embeber-se adequadamente, mergulhar
nas águas da compunção e forjar um glaivo afiado capaz de lutar contra as
paixões e os demônios. Quem chega a este estado por meio da ascese de numerosos
combates extinguiu o poder do fogo natural e fechou a boca dos leões, as
paixões selvagens. Ele foi confortado e erguido de sua fraqueza pelo Espírito.
Ele se tornou forte como um novo Jó[46],
vestiu o troféu da paciência e venceu o tentador.
43. A ordem da iluminação é a ordem dos que progrediram e que a partir
dos combates sagrados alcançaram a primeira impassibilidade. Sua natureza
própria é conhecimento dos seres, a contemplação das razões da criação e a
comunicação do Espírito Santo. Sua obra consiste na purificação do intelecto
operada pelo fogo divino, no desvelamento espiritual dos olhos do coração, no
nascimento do Verbo nas mais altas meditações do conhecimento; seu fim é a
palavra de sabedoria que expõe claramente a natureza dos seres, o conhecimento
das coisas divinas e humanas e a revelação dos mistérios do Reino dos céus[47].
Quem alcançou este grau pela obra do intelectual da inteligência é transportado
sobre o carro de fogo puxado pela quadriga das virtudes, como um novo Elias[48].
Ele é arrebatado em plena vida ao espaço inteligível e percorre as coisas dos
céus, muito acima da baixeza do corpo.
44. A ordem mística, que conduz à perfeição, é a ordem dos que já
percorreram tudo e que alcançaram a medida do talhe de Cristo[49].
Sua natureza própria é a de fender o espaço, de dominar o universo, de envolver
as ordens dos mais altos céus, de aproximar da luz primigênia e de descobrir as
profundezas de Deus pelo Espírito. Sua obra consiste em cumular o intelecto que
contempla todas essas razões relativas à providência, à justiça e à verdade,
consiste na resolução dos enigmas, das palavras e das parábolas obscuras[50]
da divina Escritura, consiste enfim em iniciar aquele que assim realiza em si
os mistérios ocultos de Deus para que ele se encha da sabedoria inefável pela
comunhão com o Espírito e se revele no meio da grande Igreja de Deus como um
sábio teólogo que, com as palavras do conhecimento divino, ilumina os homens.
Aquele que, por meio das profundezas da humildade e da compunção, atinge este
grau, penetrou no terceiro céu da teologia, como um novo Paulo. Ele escutou as
palavras inefáveis[51]
que nenhum homem sob o domínio das sensações é capaz de ouvir. Ele experimentou
os bens secretos que o olho não viu, que o ouvido não escutou[52].
Ele se tornou ministro dos mistérios divinos[53],
a boca de Deus, que serve aos mistérios revelando-os aos homens pela palavra;
nisto ele encontra o repouso benfazejo, ele se tornou perfeito no Deus
perfeito. Ele está unido com os teólogos às mais altas potências dos Querubins
e dos Serafins, que possuem a palavra de sabedoria e de conhecimento.
45. A vida dos homens se divide em duas partes, e o fim desta vida se
relaciona a três ordens. Uma parte da vida é comum e transcorre dentro do
mundo. A outra não é comum e conduz para além do mundo. O que é comum se divide
entre castidade e desejo insaciável. O que não é comum se divide em filosofia,
ciência natural e energia sobrenatural. A primeira parte, ou bem vem
naturalmente e se liga ao que é justo, ou bem perde o movimento natural, se
liga ao que é injusto e conduz à injustiça. A segunda, se for dirigida pela
regra, se buscar pelo sentido do fim[54],
termina na natureza infinita e atinge a perfeição que está acima da natureza.
Mas sem exercida por uma vã ambição, se afastar de sua finalidade, terminará
numa inteligência inepta[55],
imperfeita e com toda justiça rejeitada pela perfeição.
46. O Espírito é luz, vida e paz. Quem é iluminado pelo Espírito
divino leva assim uma vida serena em paz. O conhecimento dos seres e a
sabedoria do Verbo correm nele daí por diante, e a inteligência de Cristo lhe é
concedida. Este homem conhece os mistérios do Reino[56],
penetra nas profundezas de Deus e, dia após dia, com o coração calmo e
luminoso, fala aos homens boas palavras de vida[57].
Pois ele é bom, uma vez que traz em si o Deus bom que anuncia o novo e o antigo[58].
47. Deus é sabedoria. Deificando por meio do conhecimento dos seres
aqueles que caminham na razão e na sabedoria, ele os une a si pela luz e os
torna deuses por adoção. Do mesmo modo como criou tudo do nada pela sabedoria,
que pela sabedoria ele conduz e governa todas as coisas do mundo, que na
sabedoria ele realiza sempre a salvação de todos os que se aproximam em retorno
a ele, também aquele que, por sua pureza, recebeu partilhar da sabedoria do
alto cumpre sempre com toda sabedoria, como uma imagem de Deus, as obras da
vontade divina. Ele se recolhe longe das coisas exteriores, tão divididas, e, a
cada dia, pelo conhecimento dos segredos, eleva e aponta sua razão para as
vidas verdadeiramente angélicas. Unificando sua vida tanto quanto lhe for
possível, ele une a si mesmo às potências do alto que giram ao redor de Deus na
unidade; ele as segue como a bons guias e por meio delas sobe até a origem
primeira e a causa primeira.
48. Aquele que, pela mais alta sabedoria, se uniu às potências do
alto, que unido Deus (por que se tornou à semelhança de Deus) pela razão e a
comunhão vive com todos no amor à sabedoria, este afasta das coisas exteriores
e divididas as faculdades dos que desejam isto, com a ajuda do poder divino.
Imitando a Deus, ele os recolhe como a si próprio numa vida unitiva e os eleva
por meio da sabedoria, o conhecimento e a iluminação dos segredos, para a
contemplação da glória da única e primigênia luz. Unindo-os aos seres e às ordens
que gravitam ao redor de Deus, ele os conduz, luminoso e flamejante de
Espírito, para a unidade de Deus.
49. Oito virtudes naturais e fundamentais acompanham as quatro
virtudes. Cada uma delas, de parte e de outra de si mesmas, suscita duas outras
e se torna uma tríade. Assim, da meditação se levantam o conhecimento e a sábia
contemplação; da justiça, o discernimento e a compaixão; da coragem, a
paciência e a constância; da castidade, a pureza e a virgindade. Deus, que
configurou de três em três estas doze virtudes e que nos inicia em seus
mistérios, assenta-se acima de tudo na sua sabedoria sobre o trono do
intelecto, e envia o Verbo para que este as crie em nós. O Verbo, recebendo dos
princípios fundamentais a matéria de cada uma dessas virtudes, cria na alma o
mundo inteligível da piedade. Na alma ele desdobra a meditação como se fosse um
véu constelado de estrelas que iluminam a vida, e faz brilhar e irradiar sobre
ela o conhecimento divino e a contemplação natural, como dois grandes
luminares. Como se fosse a terra, ele funda na alma a justiça, como um festim
inesgotável. Ele estende a castidade sobre ela como o ar, para cobri-la com o
frescor do orvalho da vida sem mistura. Como o mar, ele delimita a coragem na
fraqueza da natureza, para derrubar as fortalezas e as torres[59]
do adversário. O Verbo, construindo desta maneira o mundo, coloca na alma o
Espírito, o poder do movimento perpétuo do intelecto e do recolhimento
constante que não se dispersa, como disse Davi: “Sobre a palavra do Senhor os
céus foram fundados, e pelo sopro de sua boca todo o seu poder[60]”.
50. Através das passagens que realizam de uma idade espiritual a
outra, nosso Senhor Jesus Cristo cresce naqueles que se dedicam à virtude.
Quando ainda são crianças e precisam de leite[61],
se diz que bebem o leite das virtudes elementares do exercício do corpo, cuja
utilidade diminui[62]
na medida em que crescem em virtude e se afastam da infância. Quando chegam à
adolescência e comem o alimento sólido da contemplação dos seres, porque se
exercitaram nos sentidos da alma[63],
diz-se que avançaram em idade e em graça[64],
que já se assentam entre os anciãos[65]
e que descobrem neles as profundidades ocultas nas trevas[66].
Quando enfim chegam à idade do homem perfeito, na medida da plenitude de Cristo[67],
diz-se que pregam a todos a palavra do arrependimento, que ensinam aos povos as
coisas do Reino dos céus, e que vão ao encontro dos sofrimentos[68].
Pois este é o fim de todo homem que se aperfeiçoa nas virtudes: depois de haver
atravessado todas as idades de Cristo, chegar ao sofrimento das tentações
carregando sua cruz.
51. Na medida em que estamos submetidos aos elementos da ascese,
evitando tomar alimentos, tocar as coisas, contemplar a beleza, escutar os
cantos, sentir perfumes, enquanto estamos sob a orientação de tutores e
ecônomos[69],
somos ainda crianças, mesmo que sejamos herdeiros e mestres de todas as coisas
do Pai. Mas quando o tempo da ascese chega ao seu termo e se realizou na
impassibilidade, então da pureza da reflexão nasce em nós o Verbo e sobre nós
vem a lei do Espírito, a fim de nos resgatar, a nós que estávamos sob a lei dos
cuidados da carne, e de nos conceder a adoção. Isto feito, então o Espírito
clama em nossos corações: “Abba, Pai”, nos mostrando e nos revelando a filiação
e a liberdade diante de Deus Pai. Por intermédio de Cristo ele permanece em nós
e nos fala como se fôssemos filhos e herdeiros de Deus[70].
A partir daí, estamos libertos da escravidão dos sentidos.
52. Para aqueles que, juntamente com Pedro, progrediram na fé, que,
com Tiago, se elevaram na esperança, que com João se tornaram perfeitos no amor,
o Senhor se transfigura depois de haver subido a alta montanha da teologia[71].
Pela manifestação e a marca da ele brilha diante deles como o sol. Pelos
pensamentos da sabedoria misteriosa ele flameja como luz. O Verbo se revela
neles, no meio da Lei e da Profecia, legislando e ensinando as coisas da Lei, e
descobrindo os tesouros profundos e escondidos da sabedoria das coisas da
Profecia: então ele prevê e prediz. O Espírito os cobre com sua sombra como uma
nuvem luminosa, e desta nuvem a voz da teologia mística desce sobre eles,
iniciando-os no mistério da Trindade em três Hipóstases, dizendo-lhes: “Eis
aqui meu Bem-Amado, o termo da palavra de perfeição, em quem eu me comprazo[72]:
tornem-se para mim filhos perfeitos no Espírito perfeito”.
53. A alma que despreza todas as coisas terrestres e que está
totalmente ferida pelo amor a Deus vive num êxtase estranho e divino. Pois,
depois de haver visto claramente as naturezas e as razões dos seres, depois de
ter compreendido o fim das coisas humanas, ela já não suporta permanecer
encerrada no universo nem limitada por aquilo que a cerca. Rompendo seus
limites e os laços de seus sentidos, ultrapassando a natureza de todas as
coisas, ela penetra nas trevas da teologia, no silêncio inefável, compreende a
beleza do Ser na luz da inexprimível sabedoria das meditações, na medida da
graça recebida. Mergulhando divinamente em sua contemplação naquilo sobre quê
medita, ela se delicia com os frutos das plantas imortais e com o temor
amoroso, vale dizer, com as meditações dos pensamentos divinos. Ela exprime
perfeitamente a grandeza e a glória, porque nunca está crispada sobre si mesma.
Estranhamente levada pelo Espírito, ela conhece o sofrimento louvável numa
alegria e um silêncio indizíveis. Mas como ela age, ou o que a empurra, ou o
que lhe faz ver e misticamente lhe comunica os segredos, estas coisas lhe é
impossível explicar.
54. Quem semeia em si próprio com justiça as lágrimas da compunção
recolhe o fruto da vida: uma alegria inexprimível. Quem busca e espera o Senhor
até que ele venha e produza sua justiça colherá em abundância as espigas do
conhecimento de Deus. A luz da sabedoria o iluminará e ele se tornará um
candelabro de luz eterna para iluminar todos os homens. Ele não se negará aos
que lhe estão próximos, cobrindo-a com o jarro do ciúme, esta luz de sabedoria
que lhe foi dada[73].
Ele dirá as boas palavras na Igreja dos fiéis para o benefício de muitos[74].
Ele dirá coisas que permaneceram ocultas desde a origem, tudo aquilo que ele
ouviu do alto, deixando ressoar em si o Espírito divino, e se aplicando a tudo
o que sabe por meio da contemplação dos seres e daquilo que seus Pais lhe
ensinaram[75].
55. As montanhas da obra dos mandamentos de Deus serão abertas a todo
homem consagrado no dia em que ele atingir a perfeição na virtude. Elas lhe
destilarão a doçura da alegria quando ele reinar sobre Sião pela perfeição
pura. E as colinas, as palavras de virtude, se derramarão em leite. Elas lhe
trarão o alimento quando ele repousar sobre o berço da impassibilidade. Todas
as fontes de Judá, vale dizer, sua fé e seu conhecimento, farão correr suas
águas: os dogmas, as parábolas e os enigmas das coisas de Deus. E a fonte da
sabedoria oculta jorrará de seu coração, como da mansão do Senhor, e irrigará a
ravina de juncos[76],
ou seja, os homens consumidos pela secura e o calor das paixões. Então ele
conhecerá em si o verdadeiro cumprimento das palavras do Senhor, que disse:
“Aquele que crê em mim, de seu seio correrão rios de água viva[77]”.
56. O sol de justiça, disse Deus, se eleva sobre aqueles que
reverenciam, e sua cura está em seus atos. Eles deixarão a prisão das paixões e
correrão livremente como bezerros soltos dos laços do pecado. Eles pisotearão
os homens iníquos e os demônios como se estes fossem cinzas no dia em que eu os
restabelecer, disse o Senhor que domina o universo[78],
quando eles se levantarão através de todas as virtudes e se tornarão perfeitos
pela sabedoria e o conhecimento na comunhão do Espírito.
57. Se, sobre a montanha que domina a planície[79]
deste mundo e a Igreja de Cristo, você erguer o estandarte do novo conhecimento
do alto, se você levanta em si a voz da sabedoria de Deus que lhe foi
concedida- conforme foi dito – exortando e ensinando pela palavra a seus
irmãos, abrindo a eles a inteligência da divina Escritura[80]
para que compreendam os dons maravilhosos de Deus, e se você se antecipa a eles
na obra de seus mandamentos, não tenha medo dos que invejam o poder de suas
palavras e que alteram toda a divina Escritura, homens vazios que varreram a si
próprios mas que estão prestes a se tornarem morada do diabo[81].
Pois Deus escreveu no Livro dos vivos[82]
as palavras de seus lábios, e estes homens não poderão prejudicá-lo, como não o
pode Simão a Pedro. Antes dirá você, juntamente com o profeta, neste dia em que
os vir estendendo armadilhas para fazê-lo cair no caminho: “Eis que o Senhor é
meu Deus e meu Salvador. Eu me confiei a ele. Ele me salvará e a nada temerei.
Pois o Senhor é minha glória e meu louvor, e ele me salvou. Eu não cessarei de
anunciar as obras de sua glória sobre a terra[83]”.
58. Se você perceber em si que o impulso da energia das paixões está
inerte e que brota de seus olhos a compunção que provém da humildade, saiba que
o Reino de Deus desceu sobre você e que em você concebeu o Espírito Santo. E se
você sentir a ação do Espírito, sacudindo-o e falando em seu interior, e
levando-o a proclamar na grande Igreja a salvação e a verdade de Deus, não
cerre seus lábios[84]
por causa da inveja dos judaizantes. Apenas sente-se e, como disse Isaías[85],
escreva num bloco de notas[86]
aquilo que lhe diz o Espírito: “Estas coisas acontecerão nos dias do tempo e
até a eternidade, como lhe foi dito: os que sentem inveja são um povo indócil,
filhos mentirosos que não têm fé”. São estes os que não querem acreditar que o
Evangelho age ainda e que ele criou os filhos de Deus e os profetas, mas que
dizem aos profetas e aos doutores da Igreja: “Não nos anunciem a sabedoria de
Deus”, e àqueles que enxergam as visões da contemplação natural: “Não nos falem
disto, mas reportem-nos e anunciem-nos uma nova ilusão que ame o mundo, retirem
de nós a palavra de Israel[87]”.
Não dê atenção à sua inveja e às suas palavras. Porque até os surdos, no final,
escutarão aquilo que do alto ressoa em você para o benefício de muitos outros.
E os que estão nas trevas desta vida e com os olhos cegados nas brumas do
pecado verão[88] a
luz em suas palavras. E os pobres de espírito se regozijarão[89]
com elas, os homens desesperados se encherão de alegria[90]
e os perdidos em espírito conhecerão a sabedoria de suas palavras. Os que
murmuram contra você aprenderão a obedecer às palavras do Espírito. E as
línguas que balbuciam aprenderão a dizer a paz[91].
59. Feliz daquele que tem em Sião, na Igreja de Deus, a semente do
ensinamento de suas palavras, disse Isaías[92],
e que tem seus próprios filhos, os filhos do Espírito, na cidade dos
primogênitos, na Jerusalém celeste. Pois este homem, diz-se, esconderá suas
palavras por algum tempo e ele mesmo será oculto pelas águas que o levam. No
final ele aparecerá em Sião, na Igreja dos fiéis, levado como que por um rio
glorioso sobre a terra sedenta das ondas de sua sabedoria. Os que se confiaram
a ele já não serão derrubados pelos invejosos, mas seus ouvidos escutarão as
suas palavras. O coração dos que sofrem na alma escutará com atenção. E que os
servidores da inveja não digam mais: “Silêncio”, porque um homem piedoso os
aconselhou com inteligência e não lhes disse bobagens como estes tolos que são
os sábios do mundo. Seu coração nada pensou de vão, nada existe nele que seja
iníquo, nada de falso ele disse diante de Deus, para dispersar as almas que
tinham fome e tornar vazias as almas que tinham sede[93].
Por isso suas palavras continuam a ser um auxílio para muitos, mesmo que não
pareçam sê-lo àqueles que o denigrem.
60. Para quem habita sobre uma rocha dura numa caverna elevada, o pão
do conhecimento é dado à saciedade, e o cálice da sabedoria até a embriaguez.
Assim sua transparência será fiel. Ele verá o Rei na glória e seus olhos verão
de longe a terra[94].
Sua alma meditará a sabedoria e anunciará a todos o lugar eterno, fora de onde
nada existe.
61. Assim, se a instrução do Senhor abre os ouvidos de todo homem que
o reverencia, lhe acrescenta mais um ouvido para escutar e lhe dá uma língua de
discípulo para que ele saiba quando dizer[95]
uma palavra, quem mais faria recuar os
prudentes e os sábios deste mundo desnudando a loucura de sua sabedoria[96]?
Quem mais confirmaria as palavras de seus servidores? Quem mais, senão ele
mesmo que realiza coisas novas e maravilhosas para sua glória, que traça no
coração deserto e seco um caminho de humildade e doçura, que faz jorrar, na
reflexão árida e sem água, rios de sabedoria inefável, para irrigar sua raça
eleita, o povo que ele guarda a fim de contar suas virtudes[97].
Pois ele caminha diante dos que o amam e reverenciam, ele aplaina as montanhas
das paixões, destrói as portas de bronze da ignorância, abre as portas de seu
conhecimento e lhes revela nas trevas os tesouros ocultos e invisíveis, para
que eles saibam que é ele mesmo o Senhor Deus que os chama por seu nome: Israel[98].
62. Quem é aquele que vence o oceano de paixões e detém suas vagas? É
o Senhor dos Exércitos. Ele liberta aos que o amam do perigo do pecado. Ele
transforma em calma a tempestade dos pensamentos, coloca suas próprias palavras
em suas bocas[99] e
lhes cobre com a sombra de suas mãos, sob a qual ele estendeu o céu e fundou o
mar. Ele próprio concede aos que o reverenciam uma língua de discípulo e um
ouvido inteligente[100]
para ouvir sua voz do alto e para anunciar seis mandamentos na casa de Jacó, à
Igreja dos fiéis. Mas nos que não têm olhos para ver os raios do Sol de
justiça, nem ouvidos para ouvir as maravilhas da glória de Deus, o fim da
ignorância é a obscuridade, e a esperança é vã como as palavras. Nenhum destes
diz o que é justo. Neles não existe julgamento de verdade. Eles se confiam a
coisas vãs e o que eles dizem é vazio. Eles concebem a invejam e dão a luz à
difamação. Seus ouvidos são incircuncisos, eles não conseguem escutar. Por isso
a palavra de conhecimento de Deus é para eles uma reprovação e eles não a
querem ouvir.
63. Que sabedoria pode haver entre aqueles que invejam seu próximo?
“Como, diz Jeremias[101],
os maledicentes podem dizer: Nós somos sábios, e: A lei do Senhor está do nosso
lado, se eles se consomem de inveja diante daqueles que receberam a graça do
Espírito pela sabedoria e o conhecimento de Deus? O falso conhecimento dos
escribas e dos sábios deste mundo é vã. Eles perderam o caminho da verdadeira
ciência”. É por isso que os sábios decaídos da sabedoria do Consolador foram
confundidos ao vê-lo crescer entre os filhos dos pecadores, e então temeram o
poder de suas palavras. Eles foram capturados nas redes de seus pensamentos,
uma vez que rejeitaram a verdadeira sabedoria e o conhecimento do Senhor.
64. Por que terão sido estes homens consumidos pela inveja contra
aqueles a quem a graça do Espírito tornou ricos, contra os que receberam uma
língua de fogo como a pena de um escriba alerta[102],
quando foram eles próprios que abandonaram a fonte da sabedoria de Deus? Pois
se eles tivessem seguido o caminho de Deus eles teriam permanecido para sempre
na paz da impassibilidade. Eles teriam aprendido onde está a razão, onde a
força, onde a inteligência, onde o conhecimento dos seres, onde a longevidade,
e a vida, a luz dos olhos, a sabedoria e a paz[103].
Eles teriam aprendido quem encontra o lugar da sabedoria e quem penetra em seus
tesouros. Eles teriam aprendido de que forma Deus, por meio de seu profeta, dá
suas ordens aos iniciados em sua palavra, quando diz: “Que o profeta que
recebeu num sonho uma revelação conte aquilo que viu em sonho. E quem ouviu
minha palavra proclame minha palavra com toda a verdade[104]”.
E ainda: “Escreva para mim em um livro todas as palavras que eu lhe disse[105]”.
A partir daí, jamais eles teriam sido consumidos pela inveja diante de tais
homens.
65. Se um Etíope pudesse mudar sua pele e uma pantera suas manchas[106],
também os maledicentes poderiam dizer e projetar o bem, mesmo pensando o mal.
Eles enganam o próximo com suas mentiras porque avançam com truques e se riem
de seus amigos. Eles não dizem a verdade, pois sua língua já não sabe falar
senão uma linguagem vã e falsa[107].
Compreenda, portanto, você, que pelo conhecimento e a palavra de Deus que estão
consigo, é invejado e desdenhado por eles. Ore assiduamente e diga com
Jeremias: “Senhor, lembre-se de mim, visite-me, guarde-me destes homens maus
que me perseguem. Em sua paciência, depois de me testar por tanto tempo, não me
rejeite. Saiba que eu sou o opróbrio dos que rejeitam seu o conhecimento.
Consuma-os na sua inveja, e a palavra de seu conhecimento fará o regozijo e a
alegria de meu coração. Pois eu jamais me sentei na assembleia dos que se riem
de seu conhecimento. Eu me confiei às suas mãos. Sentei-me na solidão, pois sua
inveja me enchia de amargura. Você me ouvirá, bem o sei, porque você faz com
que os perdidos retornem de seus descaminhos (...) Eu o restabelecerei entre
meus amigos. Você estará diante da minha face. Se, daquilo que é indigno você
extrai o que é nobre, você será como a minha boca. Eu o livrarei das mãos dos
malfeitores que o ultrajam, disse o Senhor Deus de Israel[108]”.
66. Que os sábios maledicentes escutem todo o fim do discurso[109].
Por meio de suas penas, os Nazireus[110]
de Deus se tornaram mais puros do que a neve. Em suas vidas eles estão mais
brancos do que o leite. O brilho de sua sabedoria supera o da safira[111],
e a forma de sua palavra a da pérola pura. Os que comeram das delícias do
conhecimento deste mundo desapareceram. O Espírito os deixou. Os que se
alimentaram do grão de sabedoria dos Gregos foram recobertos pelo fumo da
ignorância[112].
Eles lançaram cordas sobre si mesmos e ficaram presos a si próprios. Pois sua
língua está colada à sua garganta e eles se tornaram mudos. Eles rejeitaram
receber, a custa de penas, a verdadeira sabedoria e o verdadeiro conhecimento
do Espírito divino.
67. Deus, que derruba a árvore que se ergue e levanta a que cai, que
seca a árvore verde e faz reflorir a árvore seca[113],
ele próprio abre a boca dos seus servidores[114]
no meio da assembleia numerosa e concede a palavra a todos os que anunciam
poderosamente a boa nova[115].
Pois a ele pertencem a sabedoria, a inteligência e a força. E assim como ele
muda os tempos e os anos, ele faz reinar sobre as paixões as almas que o buscam
e o desejam. Ele os faz passar da vida para a Vida, concedendo por meio do
Espírito a sabedoria aos sábios e a inteligência aos que são capazes de
compreender. Ele próprio revela aos que sondam as profundezas de Deus as coisas
enterradas e ocultas. Ele lhes dá a conhecer aquilo que está envolto nas trevas
dos enigmas. Pois a luz da sabedoria e do conhecimento está com ele[116],
e ele a concede a quem ele quiser.
68. Para aquele que cumpre com perseverança os mandamentos relativos
ao homem exterior e ao homem interior, para quem não vê senão a glória de Deus,
são concedidas a honra do conhecimento do céu, a paz da alma e a
incorruptibilidade. Pois este não se contenta apenas com ouvir, ele realiza a
obra da lei da graça[117].
Seu conhecimento é atestado pelas obras, e Deus não o despreza, mas, juntamente
com ele, glorifica este conhecimento pelas palavras que vêm através dele e que
manifestam a luz que sua sabedoria faz brilhar na Igreja dos fiéis. Pois Deus
não faz acepção de pessoas[118].
Mas a quem se entrega às brigas, a quem desobedece às palavras dos que trazem o
Espírito[119],
que se deixa persuadir por seu próprio intelecto e pelas palavras enganadoras
daqueles que só se cercam de piedade na aparência[120]
e que são levados por um espírito de ambição e de amor ao prazer, a este é dada
a aflição e a angústia, a inveja, a concupiscência e a cólera. A partir daí
este pagará por seu erro e ao final denunciará os pensamentos que se acusarão
mutuamente ou que o justificarão, no dia em que Deus julgar os segredos dos
homens e retribuir a cada qual segundo suas obras[121].
69. Não é judeu aquele que apenas parece, como se diz, nem é
circuncisão aquela que é visível na carne, mas é judeu aquele que o é
secretamente, e é circuncisão aquela feita no coração, que provém do espírito e
não da letra[122].
Da mesma forma o homem perfeito no conhecimento e na sabedoria não é aquele que
o é apenas por sua eloquência e sua bela linguagem, como não é um asceta
realizado aquele que estaciona no exercício corporal e visível das penas, mas
aquele que se consagra à obra espiritual secreta. Quem fala com um coração puro
e bom é um sábio perfeito em conhecimento pelo Espírito de Deus, e não pela
letra. Seu louvor não vem dos homens, mas de Deus[123].
Os homens o ignoram e invejam. Somente Deus e aqueles que são animados pelo
mesmo Espírito o amam e conhecem.
70. Se nenhuma carne é justificada perante Deus pelas obras da lei[124],
como foi dito, que, apenas pelos combates e as penas da ascese, atingirá a
perfeição diante de Deus? Com efeito, pela ação nós nos encaminhamos ao estado
de virtude e reprimimos a energia das paixões. Mas não é apenas pela ação que
nos tornamos homens perfeitos na plenitude de Cristo. Então, o que nos leva à
perfeição? A fé interior em Deus: ela é o fundamento daqueles que esperam[125].
Por causa dela Abel ofereceu a Deus um sacrifício maior do que Caim e foi
confirmado como justo[126].
Por ela Abrahão, ao ser chamado, aceitou partir e foi habitar na terra
prometida[127].
É ela que conduz os que são verdadeiramente fervorosos e os eleva até as
grandes esperanças dos mais altos dons de Deus, e de lá até o conhecimento dos
seres. É ela que coloca em seu coração os tesouros inesgotáveis do Espírito,
para que estes lhe exprimam os mistérios novos e antigos de Deus[128],
e para que ele os dê aos que disto necessitam. O homem que recebeu a graça
desta fé se eleva pelo amor até a perfeição do conhecimento de Deus e entra em
seu repouso[129]. Ele mesmo repousa das obras realizadas, como
Deus repousou das suas próprias[130].
71. Deus fez desde o começo a promessa: os que não forem fiéis não
entrarão no repouso. Assim sendo, é pela sua falta de fé que eles não podem
entrar[131].
Isto posto, como poderiam alguns, apenas pelo exercício corporal, sem fé,
entrar no repouso da impassibilidade e na perfeição do conhecimento, quando
vemos tantos homens incapazes de aí entrar e repousar de todas as suas penas?
Portanto, cada qual deve investigar se não tem em si um coração pervertido pela
incredulidade[132].
Pois é por causa desta última que falta a eles o repouso e a perfeição, embora
se entreguem a tantas penas. Por isso eles se afadigam todo o tempo nas obras
ativas e comem o pão da dor[133].
Se eles não conhecem a graça do sétimo dia[134],
que se esforcem para entrar pela fé no repouso da impassibilidade e na
perfeição do conhecimento, a fim de não caírem na expressão original da
desobediência[135]
e não serem submetidos às mesmas coisas que aqueles que um dia foram infiéis.
72. Dotados de sentidos, mas também de palavra e intelecto, devemos
oferecer de nós mesmos um dízimo a Deus. Dotados de sentidos, devemos perceber
atentamente as coisas sensíveis e por meio de sua beleza nos elevarmos até o
Criador, atribuindo a ele o conhecimento irrepreensível dessas coisas. Dotados
de palavra, devemos falar o bem das coisas divinas e humanas. Dotados de
intelecto, devemos pensar sem erros em Deus, na vida eterna, no Reino dos céus,
nos mistérios do Espírito nele ocultos. Tudo isto para provar que sentimos,
falamos e compreendemos sã e irrepreensivelmente segundo Deus. Esta é a
verdadeira medida e a santa oferenda a Deus.
73. O dízimo que em primeiro lugar devemos a Deus é a Páscoa da alma,
ou seja, a superação de todo estado passional e de toda sensação desprovida de
razão. Durante esta Páscoa, o Verbo é oferecido em sacrifício por meio da contemplação
dos seres. Ele é comido no pão do conhecimento e seu sangue precioso é bebido
no cálice da sabedoria misteriosa. Aquele que comeu e celebrou a Páscoa
sacrificou em si mesmo o Cordeiro que tira o pecado do mundo[136],
e já não mais morrerá, conforme a palavra do Senhor, mas viverá por toda a
eternidade[137].
74. Aquele que se levantou de suas obras mortas ressuscita com Cristo.
E se ressuscita com Cristo por meio do conhecimento, Cristo já não morre mais
nele, a morte da ignorância já não mais o domina. Pois aquilo que um dia morreu
devido ao pecado, levado por seu movimento natural, morreu de uma vez por
todas. O que agora vive, vive por Deus[138],
pela liberdade do Espírito Santo, que o levantou de entre as obras mortas do
pecado. Ele próprio já não vive mais para a carne e para o mundo, porque morreu
para os membros de seu corpo e para as coisas da existência. Mas Cristo vive
nele[139]
a partir do momento em que ele está sob a graça do Espírito Santo, que ele não
está mais submetido à lei da carne, e que ele oferece a Deus Pai seus membros
como armas de justiça[140].
75. Aquele que libertou seus membros da escravidão das paixões e os
colocou a serviço da justiça[141]
entra na santificação do Espírito Santo, tendo superado a lei da carne. O
pecado não mais o dominará. Ele se confiou à liberdade e à lei do Espírito.
Pois o fim do serviço da justiça não é como o fim da escravidão das paixões.
Esta termina na ruína inteligível da alma. Mas aquela conduz à vida eterna
oculta em Jesus Cristo[142]
nosso Senhor.
76. Enquanto o homem viver carnalmente, a lei da carne o dominará. Mas
se ele perece, se se faz de morto para o mundo, ele se livra desta lei[143].
Não existe outro caminho para se morrer para o mundo senão fazendo morrer os
membros do corpo. Nós os levamos à morte quando comungamos do Espírito Santo. E
sabemos que comungamos do Espírito Santo quando oferecemos a Deus frutos dignos
do Espírito: o amor a Deus com toda nossa alma, o amor ao próximo com todas as
nossas forças, a alegria do coração que vem de uma consciência pura, a paz na
alma que provém da impassibilidade e do auto rebaixamento, a bondade dos
pensamentos do intelecto, a paciência nas aflições e nas tentações, a
simplicidade de uma vida modesta, a fé interior em Deus e que não duvida de
nada, a doçura na humildade, a compunção e a temperança dos sentidos que abarca
tudo. Quando levamos estes frutos a Deus, passamos ao largo da lei da carne.
Não existe mais lei que nos castigue por causa dos frutos que nos dera a morte
quando ainda vivíamos conforme a carne. Pois fomos libertos desta lei[144]
desde que fomos levantados de nossas obras mortas, com Cristo, pela liberdade
do Espírito.
77. Os que receberam as primícias do Espírito pelo banho do novo
nascimento e que as guardaram com todo vigor, pressionados pela pesandez da carne,
gemem por si e, com a chegada do Consolador em sua plenitude, aguardam a
filiação[145],
a fim de ver seu próprio corpo liberto da escravidão da corrupção. Pois o
Espírito vem em socorro de sua fraqueza natural e intercede por eles com
gemidos inefáveis[146].
Seus corações estão em Deus e suas esperanças esperam ver em sua carne mortal a
revelação do Filho de Deus, a morte vivificante de Jesus[147],
a fim de se tornarem também filhos de Deus conduzidos pelo Espírito Santo, a
fim de receberem a libertação da escravidão da carne e alcançar a liberdade da glória
dos filhos de Deus, por quem tudo concorre para o bem, pois eles amam a Deus[148].
78. A divina Escritura deve ser interpretada espiritualmente, e é aos
espirituais que são revelados pelo Espírito Santo os tesouros que estão
contidos nela. O homem psíquico não pode receber tal revelação[149].
Este segue seus próprios pensamentos e recusa ouvir ou compreender o que dizem os
outros, porque não traz em si o Espírito de Deus que sonda as profundezas de
Deus e que conhece as coisas de Deus[150].
Ele tem em si o espírito material do mundo, cheio de ciúme e inveja,
transbordando de querelas e divisões[151].
Por isso buscar o sentido e descobrir a inteligência das palavras lhes parece
uma loucura. Pois, ignorando que tudo o que está nas divinas Escrituras, relativamente
às coisas divinas e humanas, só pode ser considerado espiritualmente, eles se
riem daqueles que as veem assim. Na medida em que, como Demas[152],
seu pensamento distorce e inverte os pensamentos divinos e as palavras de tais
homens, eles afirmam que estes não são espirituais, que não são conduzidos pelo
Espírito de Deus, que não têm método. Mas o espiritual não é assim. A tudo ele
julga inspirado pelo Espírito divino. Ele próprio não pode ser julgado por
ninguém: porque ele tem em si a inteligência de Cristo, a qual ninguém jamais
poderá instruir[153].
79. No fogo da revelação do último dia, que então provará a obra de
cada um[154],
diz Paulo, caso esta obra seja de essência incorruptível e lhe tenha sido dada
para edificação, ela permanecerá intacta no meio do fogo. Não apenas ela não
queimará, mas resplandecerá em luz, inteiramente purificada, mesmo da menor
mácula. Ao contrário, se a obra de alguém foi dedicada à matéria perecível e se
ligou a ela para torná-la ainda mais pesada, ela será consumida[155]
e o abandonará vazio no meio do fogo. A obra incorruptível, a que permanece, são
as lágrimas do arrependimento, a misericórdia, a compaixão, a prece, a
humildade, a fé, a esperança, o amor, e tudo o mais que é feito em vista da
piedade: aquilo que, enquanto vive o homem, o edifica como um santo homem de Deus[156]
e que, quando ele morre, parte consigo e permanece incorruptível por toda a
eternidade. A obra que perece no fogo – é evidente para qualquer um – consiste no
amor pelos prazeres, pela vanglória e pelo dinheiro, no ódio, na inveja, no
roubo, na embriaguez, no ultraje, na condenação e toda falsidade que se realiza
no corpo por concupiscência ou cólera. Estas coisas perecem junto com o homem
que as traz em si, quando este é queimado pelo fogo da concupiscência e
arrancado de seu corpo. E, ao desaparecer, elas abandonam no meio do fogo o
operário eternamente atormentado pelos séculos dos séculos.
80. O conhecimento de Deus significa que é conhecido por Deus aquele
que nele se edifica humildemente e com a oração, e que ele recebe de Deus a
riqueza do verdadeiro conhecimento de seus mistérios sobrenaturais. Mas se a pessoa fica inchada por isto, ela já
não está sendo edificada no conhecimento pela humildade e a prece, mas é levada
pelo espírito material deste mundo. Por isso tal homem crê saber essas coisas,
mas não conhece as coisas divinas como elas devem ser conhecidas[157].
Ao contrário, aquele que ama a Deus, que considera que nada é preferível ao seu
amor e ao amor pelo próximo, este conhece tanto as profundezas de Deus como os
mistérios de seu Reino, do modo como deve conhecê-los alguém que é guiado pelo
Espírito divino[158].
E, realizando pelo amor a vontade de Deus como
um verdadeiro operário do Paraíso de sua Igreja, ele se torna conhecido
de Deus[159].
Pois ele faz com que as almas regressem, torna dignos os indignos[160]
pela palavra que lhe é dada pelo Espírito Santo e mantém sua obra intacta pela
humildade e a compunção.
81. Todos fomos batizados em Cristo pela água e o Espírito Santo.
Todos comemos do mesmo alimento espiritual e bebemos da mesma bebida
espiritual. Isto é Cristo. No entanto Deus não se compraz na maior parte de nós[161].
De fato, muitos fiéis e monges oprimiram e esgotaram seus corpos sob o peso de inúmeras
penas de ascese e exercícios corporais, mas não tiveram a compunção que provém
de um coração quebrantado ligado ao bem, nem a compunção inspirada pelo amor ao
próximo e a si mesmo. Por isso eles ficaram vazios, perderam a plenitude do
Espírito Santo e se afastaram do conhecimento de Deus. A matriz de seu pensamento
permaneceu estéril, e suas palavras não contém sal nem luz.
82. O que o Verbo pede aos Nazireus[162]
não consiste apenas em subir pela ação a montanha do Sinai, nem em se purificar
antes de subir, nem em lavar suas vestes, nem em se abster de mulher[163],
mas em ver a Deus, não por trás[164],
mas ele próprio em sua glória, comprazendo-se neles, dando-lhes as tábuas do
conhecimento e enviando-os para edificar seu povo[165].
83. Depois de haver revelado seus mistérios ocultos, seus maiores
mistérios, o Verbo não tomou consigo todos os seus servidores e discípulos, mas
apenas a alguns deles, a quem ele concedeu um ouvido, aos quais abriu os olhos
e deu ainda uma língua nova[166].
Tomando-os em separado dos demais, que também eram seus discípulos, ele subiu o
monte Tabor da contemplação e se transfigurou diante deles[167].
Ele não os iniciou ainda no Reino dos céus, mas mostrou-lhes a glória e o
esplendor da Divindade. Ele concedeu Às suas vidas e às suas palavras que
brilhassem por si próprias como o sol no meio da Igreja dos fiéis. Ele
transformou seus pensamentos em brancura, em pureza de luz radiante. Neles ele
colocou seu intelecto e os enviou a proclamar com suas bocas o novo e o antigo[168],
para que edificassem sua Igreja.
84. Muitos colocaram todo seu cuidado em cultivar seus campos,
lançando neles uma semente pura, depois de haver cortado as ervas daninhas e
queimado os cardos sob o fogo do arrependimento, mas, como Deus não espalhou
sobre seus campos a chuva do Espírito Santo que é suscitada pela compunção,
estes campos nada produziram e se consumiram na secura. Eles não produziram por
si sós as espigas fecundas do conhecimento de Deus. É por isso que, mesmo não tendo
passado fome nem sido privados da palavra de Deus, eles não receberam seu
conhecimento e permaneceram de mãos vazias, tiveram pouco o que levar para se
alimentarem no festim e morreram na alma.
85. Todo homem que pronuncia com sua boca palavras confiáveis para a
edificação do próximo as extrai do bom tesouro do seu coração, por ser bom,
como disse o Senhor[169].
Ninguém pode se dedicar à teologia e dizer coisas relativas a Deus, se não for
no Espírito Santo[170].
E ninguém, se falar pelo Espírito de Deus, pode dizer coisas contrárias à fé em
Cristo. Mas afirmando aquilo que edifica, que conduz a Deus e a seu Reino, ele
restabelece a nobreza primordial e une a Deus muitos que se salvam. E, se a
revelação do Espírito é dada a cada um para seu benefício[171],
aquele que recebeu em abundância a palavra da sabedoria de Deus e que escutou a
palavra do conhecimento é conduzido pelo Espírito divino. Ele se torna a morada
dos tesouros inesgotáveis de Deus.
86. Todo homem batizado em Cristo e que acreditou jamais será deixado
sem a graça do Espírito, desde que não se entregue às energias do espírito contrário,
se não manchar a fé com suas obras e se não viver na irresponsabilidade e na
negligência. Pois ele terá guardado vivas as primícias do Espírito Santo
recebidas por meio do santo batismo. Ou então as terá reacendido com obras de
justiça, caso estas se tenham extinguido. É impossível que ele não receba do
alto o cumprimento desta justiça. Pois, ou bem ele conduziu o bom combate da
palavra da sabedoria de Deus e, pela plenitude do Espírito, se tornou digno de
ensinar na Igreja; ou ele recebeu a palavra do conhecimento dos mistérios de
Deus e o mesmo Espírito o tornou digno de ver os mistérios do Reino dos céus;
ou ele recebeu a fé interior, no mesmo Espírito, e lhe foi concedido crer nas
promessas de Deus, como Abrahão; ou ele recebeu o carisma da cura no mesmo
Espírito, para curar os enfermos; ou ele recebeu a energia das potências para
expulsar os demônios e fazer milagres; ou recebeu o dom das profecias para
prever e predizer as coisas por vir; ou o discernimento dos espíritos, para
distinguir quem fala e quem não fala no Espírito de Deus; ou a interpretação
das diferentes línguas[172],
ou a proteção dos aflitos, ou a condução dos rebanhos de Deus[173]
e do povo, ou o amor por todos e seus carismas, a paciência, a bondade e tantos
outros[174].
Mas se alguém não possui nenhum destes dons, já não posso afirmar que ele seja
fiel, nem posso contá-lo dentre os que se revestiram de Cristo pelo batismo
divino[175].
87. Aquele que tem amor não é capaz de invejar por ciúme. Ele não
fanfarroneia por orgulho e presunção, nem se infla contra ninguém, nem faz o
que possa ser inconveniente ao próximo. Ele não busca seus próprios interesses,
mas os do próximo. Ele não se irrita prontamente contra aqueles que o afligem,
nem investiga se aquilo que lhe acontece é mau. Ele não se regozija com as
faltas de seus amigos, mas, juntamente com eles, com a verdade e a justiça. Ele
aceita todas as aflições que lhe advêm. Em tudo ele crê, com simplicidade e inocência.
Ele espera receber de Deus o fruto de tudo o que ele nos prometeu. Ele suporta
tudo o que lhe advém na forma de tentações e não devolve o mal com o mal. O
operário do amor jamais abandona o amor ao próximo[176].
88. Dentre aqueles a quem foi concedido receber do alto a graça do
Espírito Santo em seus diferentes carismas, alguns ainda são crianças e não
atingiram a perfeição à qual os carismas divinos conduzem, enquanto outros são
adultos e perfeitos na plenitude destes carismas. Os primeiros, compenetrados no
cumprimento dos mandamentos divinos, crescem por meio destes e, cumulados com
os maiores dons do Espírito, abandonam os carismas próprios da infância. Os
outros, indo além e até o final no amor e no conhecimento de Deus, fazem cessar
em si os carismas parciais, quer sejam estes a profecia, como foi dito, ou o
discernimento, a inteligência das coisas ou o governo dos homens[177],
etc. Pois aquele que penetrou no templo do amor já não conhece apenas
parcialmente ao Deus Amor, mas, encontrando-o face a face, conhece-o como ele
próprio é conhecido por Deus[178].
89. Aquele que, em sua fervorosa busca pelos carismas espirituais,
persegue e descobre o amor, já não suporta, pela prece e a leitura, falar
apenas para sua própria edificação. Pois quem, por meio da prece e da salmodia,
só fala a Deus com sua língua, edifica a si mesmo, como disse Paulo, mas deve também
se apressar em profetizar para edificar a Igreja de Deus[179],
ou seja, em ensinar aos que lhe são próximos a obra dos mandamentos de Deus e o
modo como devem se esforçar para agradar a Deus. Em que poderia servir aos
demais aquele que diariamente não fala senão a si próprio e a Deus por meio da
prece e da salmodia, se não falar também aos que dependem dele, seja por uma
revelação do Espírito Santo, seja pelo conhecimento dos mistérios de Deus, seja
pelo carisma da previsão e da profecia, seja pelo ensino[180]
da palavra da sabedoria de Deus? Quem dentre seus discípulos irá se preparar
para combater[181]
as paixões e os demônios se ele não lhes dispensar um ensinamento claro, por
escrito ou de viva voz? Na verdade, se o pastor não busca edificar seu rebanho
para que este receba em abundância a palavra do ensino e do conhecimento do
Espírito, sua busca pelos carismas de Deus carece de fervor. Pois, não fazendo
mais do que cantar e orar apenas com sua língua em espírito, ou seja, orando com
sua alma, ele edifica a si próprio, mas seu intelecto permanece estéril[182]:
ele não profetiza, nada ensina nem edifica a Igreja de Deus. Se Paulo, que, mais
do que todos os homens, se uniu a Deus, preferia dizer na Igreja cinco palavras
com sua inteligência fecunda para ensinar aos outros, mais do que dizer dez mil
palavras de salmodia com a língua[183],
isto significa que os que dirigem os homens se desviarão para longe do caminho
se abandonarem seu encargo de pastores para se dedicarem apenas à leitura e à
salmodia.
90. Aquele que, a partir d matéria e da essência intelectual, nos
concedeu o ser, aquele que paradoxalmente uniu e constituiu em um só todos os
elementos da natureza que por si só são contrários, também nos deu a arte de
bem viver pela palavra de sua sabedoria e a palavra do conhecimento, para que,
de um lado, por meio do conhecimento do Espírito vejamos os tesouros do Reino
dos céus ocultos junto a ele e que ele nos concedeu e, de outro lado, por meio
da sabedoria de sua palavra, possamos dar aos que nos estão próximos a riqueza
de sua bondade e os bens da vida eterna, que ele preparou para a delícia
daqueles que o amam[184].
91. Quem ultrapassou as ameaças e as promessas das três leis penetrou
na vida que já não está sujeita à lei. Este se tornou a própria lei da Igreja e
já não está sob o poder da lei. A vida que não está sujeita à lei é livre e
está acima de toda necessidade natural e de toda desorientação. Quem nela
penetra está livre, como se vivesse fora da carne. Ele se torna como o fogo na comunhão
do Espírito, totalmente unido a Cristo, acima de toda natureza. Nele foi
abolido tudo o que é parcial[185].
92. Quem chegou ao conhecimento do Intelecto primigênio, que é o
começo e o fim do universo, já não tem em si nenhum limite e se encontra
simultaneamente dentro e fora de todos os seres; este é capaz de permanecer só
e de viver só em meio aos solitários. Ele não perde nada de sua perfeição por
estar só, nem perde sua solidão por estar junto de muitos outros. Ele é sempre
o mesmo em qualquer parte, e é só em tudo. Ele tem como começo o movimento que
o leva à solidão no meio dos demais, e como fim a mais alta perfeição da
virtude.
93. A união sem confusão, a conjunção da alma e do corpo, quando de
acordo consigo mesma, constitui uma só e mesma obra, seja da matéria, seja da
natureza. E se ela não esta em acordo, um combate interior desperta o desejo de
vitória. Mas a razão vem e toma o poder, dissipando logo toda inveja e colocando
a concórdia à frente. Assim ela entrega a totalidade das obras à natureza e ao
Espírito.
94. Dos três seres que nos constituem, um comanda e não é comandado;
outro comanda e é comandado; e o terceiro não comanda e é comandado. Assim,
quando aquele que comanda se vê dominado pelos que são comandados, aquele que é
livre por natureza se vê submetido aos que normalmente são sujeitados. Ele é
deslocado de sua própria hegemonia e de sua natureza própria. Assim se
estabelece um grave conflito entre eles e, se este conflito existe, não se pode
dizer que tudo está submetido à razão[186].
Mas quando o que comanda consegue dominar os outros e conduzi-los sob seu poder
e sua soberania, então tudo o que estava separado é reunido no Um e entra em
acordo, e o que conduz a Deus traz consigo a paz. Estando tudo sujeito ao
Verbo, o Reino é entregue por ele a Deus Pai[187].
95. Quando os cinco sentidos submetidos aos quatro princípios das
virtudes fundamentais guardam em si a docilidade, eles dispõem a natureza do
corpo, formada por quatro elementos[188]
a seguir sem perturbações a roda da vida. Neste movimento da natureza, as potências
não se revoltam contra sio mesmas. A parte passional do desejo e do ardor se
une à razão. O intelecto, assumindo seu poder natural, faz dos quatro
princípios seu carro, dos cinco sentidos submissos seu trono e, combatendo a
carne tirânica, arrebatado aos céus, é conduzido pela quadriga[189].
Ele se apresenta ao Rei do universo, recebe a coroa da vitória e repousa nele
da longa carreira.
96. Para os que se tornaram perfeitos no tempo da contemplação e que
estão fundamentados sobre as colunas do Espírito, o cálice está preparado e o
pão já foi trazido para a mesa real. Eles repousam sobre o trono, ricos em
prata. Um tesouro de pérolas e pedras preciosas está às suas portas e uma
riqueza incontável é colocada em suas mãos. A ação logo faz deles homens
clarividentes em suas obras. Ela os prepara a que se dirijam ao Rei e não para
os homens preguiçosos.
97. O Reino dos céus é concedido já aqui em baixo a todos os que se
consagram a Deus, ou apenas após a dissolução do corpo? Se ele é concedido
desde agora, a vitória é invencível, a alegria inefável e nossa elevação ao
Paraíso é livre. Pois este se encontra diretamente no oriente divino[190].
Mas se devemos espera-lo após a morte e a dissolução, e se o abandono do mundo
é feito sem temor, aprendamos no que consiste o Reino dos céus, o Reino de Deus
e o Paraíso, e no que um difere do outro, e qual é o tempo de cada um, e como,
quando e depois de quanto tempo nos será dado penetrar num ou noutro. Pois quem
viveu no interior do primeiro, ao mesmo tempo em que existia aqui em baixo
revestido de sua carne, também não deixou de estar nos outros.
98. O mundo do alto, que ainda não está acabado, aguarda para se
realizar recebendo os primogênitos de Israel, que querem a Deus, para seu
restabelecimento. Pois o mundo do alto se realiza e termina por meio daqueles
que alcançam o conhecimento de Deus. Uma vez acabado, ele põe fim ao mundo de
baixo, o mundo dos fiéis e dos infiéis e abre a todos uma passagem para si,
dispensando a cada um o mesmo grau e separando de uns e de outros aquilo que
não estava em si unido a ele. Ele conduz para si, provindo de si mesmo, a origem
e o fim dos seres. Ele lhes assinala os limites, como uma fronteira sem
margens. Mas ele próprio não é conduzido por nenhuma outra origem. Nada o
transporte e nada o limita. Pois ele é em si o movimento perpétuo, não
confinado em si mesmo, mas que ao mesmo tempo não ultrapassa seus próprios
limites. Mas ele realiza o sábado dos outros, e é o repouso de toda origem e de
todo começo.
99. A unidade das Potências
do alto, que canta os louvores, dirige os hinos e conduz o coro, tem uma
composição trinitária. Ela está diante da Trindade de modo trinitário,
celebrando a Liturgia e oferecendo o louvor temerosamente. Uns se estendem sob
a origem e a causa de tudo. Eles procedem desta origem, são os mais próximos e
dirigem os hinos: seus nomes são os Tronos, os Querubins e os Serafins. Eles
têm como característica a sabedoria inflamada, o conhecimento do celeste, e sua
finalidade é o hino divino de El[191], em língua hebraica. Os
que estão entre os três primeiros e os três seguintes na ordem, rodeiam a Deus.
São os Poderes, as Dominações e as Potências. Eles têm como característica a
direção das grandes coisas, a energia dos milagres e os prodígios dos sinais.
Sua finalidade é o hino três vezes santo: Santo, Santo, Santo[192]. Os últimos, os mais
próximos de nós, estão acima de nós mas abaixo daqueles que cercam a Deus. São
os Principados, os Arcanjos e os Anjos. Deles é propriamente o serviço
litúrgico e sua finalidade é o hino sagrado do Aleluia[193]. A natureza racional
que está nos homens, que leva à perfeição toda virtude e que eleva toda
sabedoria e todo conhecimento do Espírito e do fogo divino, se une a essas
potências pelos carismas de Deus, atraída que é por todos através da pureza.
Ela se une a uns pelo serviço e a liturgia dos mandamentos de Deus; ela se une
a outros pela compaixão, pela proteção dos irmãos de raça e ainda pela economia
das grandes coisas de Deus e pelas energias do Espírito; enfim, ela comunga dos
terceiros pela sabedoria inflamada da palavra e pelo conhecimento das coisas
divinas e humanas. Assim completa, e oferecendo, para transmutá-los, os dons da
natureza, por meio deles ela se une a Deus pela década[194], oferecendo de si a ele
as primícias do dízimo.
100. Deus é Unidade e
Trindade. Ele tem sua origem na Unidade e seu fim em si mesmo como num círculo,
tal como a década. Ele tem em si a origem e o fim de tudo. Mas ele também está
além de tudo, porque está acima do universo. Quem entra em Deus penetra nas
razões e no conhecimento dos seres: fora de tudo, permanece no entanto no
interior de tudo. Ele conhece a origem e o fim das coisas, pois ele está, em
seu Intelecto, unido ao Pai pelo Verbo e perfeito no Espírito. A esta
perfeitíssima e indivisível Trindade consubstancial, adorada no Pai, no Filho e
no Espírito Santo, glorificada na Natureza única, no único Reino, na Potência
única da Divindade, seja dada a honra, o poder e a glória pelos séculos dos séculos.
Amém.
[1] A
Luz original.
[2] Romanos 8: 14.
[3]
Cf. II Coríntios 7: 1.
[4] Cf.
Salmo 44 (45): 1.
[5]
Cf. Gálatas 5: 23.
[6]
Cf. Salmo 76 (77): 11.
[7]
Cf. João 15: 26.
[8]
Cf. João 14: 26.
[9]
Cf. Gênesis 1: 26.
[10]
Cf. II Coríntios 5: 4.
[11]
Cf. II Coríntios 4: 11.
[12]
Cf. Gênesis 1: 26.
[13]
CF. Habacuque 3: 3.
[14] Salmo 88 (89): 9.
[15] Salmo 144 (145): 17.
[16] Salmo 24 (25): 8.
[17] Mateus 5: 48.
[18] Levítico 20: 26.
[19] Mateus 11: 29.
[20]
Cf. Salmo 32 (33): 6.
[21] Jeremias 15: 19.
[22]
Cf. Mateus 25: 20.
[23]
Cf. Colossenses 1: 20.
[24]
Ação sagrada: celebração dos mistérios de Deus.
[25]
Cf. Gálatas 5: 17.
[26]
Cf. II Coríntios 5: 4.
[27]
Cf. Êxodo 10: 21.
[28]
Cf. Mateus 13: 52.
[29]
Cf. Mateus 7: 6.
[30]
Designa o poder do Reino de Deus.
[31]
Cf. Denis o Areopagita, Hierarquia
celeste VII, 1.
[32]
Cf. Romanos 8: 29.
[33]
Cf. Salmo 81 (82): 1.
[34]
Cf. Salmo 76 (77): 11.
[35]
Cf. Romanos 5: 5.
[36]
Cf. II Coríntios 12: 4.
[37] Gálatas 5: 22.
[38]
Cf. Gênesis 2: 15.
[39]
Cf. João 4: 24.
[40]
Cf. I Timóteo 4: 8.
[41]
Cf. Efésios 4: 13.
[42]
Cf. Colossenses 3: 10.
[43]
Cf. Mateus 23: 26.
[44]
Cf. II Coríntios 7: 1.
[45]
Cf. Salmo 103 (104): 15.
[46]
Cf. Hebreus 11: 33-34.
[47]
Cf. Lucas 8: 10.
[48]
Cf. II Reis 2: 11. A quadriga das
virtudes consiste nas quatro virtudes fundamentais que conduzem do corpo carnal
ao corpo glorioso.
[49]
Cf. Efésios 4: 13.
[50]
Cf. Provérbios 1: 6.
[51]
Cf. II Coríntios 12: 4.
[52]
Cf. I Coríntios 2: 9.
[53]
Cf. I Coríntios 4: 2.
[54]
Cf. Filipenses 3: 14.
[55]
Cf. Romanos 1: 28.
[56]
Cf. Lucas 8: 10.
[57]
Cf. Salmos 18 (19) 3; 44 (45): 2.
[58]
Cf. Mateus 13: 52.
[59]
Cf. II Coríntios 10: 4.
[60] Salmo 32 (33): 6.
[61]
Cf. Hebreus 5: 12.
[62]
Cf. I Timóteo 4: 8.
[63]
Cf. Hebreus 5: 14.
[64]
Cf. Lucas 2: 52.
[65]
Cf. Lucas 2: 46.
[66]
Cf. Jó 12: 22.
[67]
Cf. Efésios 4: 13.
[68]
Cf. Lucas 12: 50.
[69]
Cf. Gálatas 4: 2.
[70]
Cf. Gálatas 4: 6-7.
[71]
Cf. Mateus 17: 1.
[72]
Cf. Mateus 17: 5.
[73]
Cf. Mateus 5: 15.
[74]
Cf. Salmo 18 (19): 5.
[75]
Cf. Salmo 77 (78): 2-3.
[76]
Cf. Joel 4: 18.
[77] João 7: 38.
[78] Cf.
Malaquias 4: 2-3.
[79]
Cf. Lucas 6: 71.
[80]
Cf. Lucas 24: 32.
[81]
Cf. Mateus 12: 44.
[82]
Cf. Apocalipse 3: 5.
[83] Salmo 12: 2-4.
[84]
Cf. Salmo 39 (40): 10.
[85]
Cf. Isaías 30: 8-10.
[86]
Literalmente: “numa tabuinha”.
[87]
Cf. Isaías 30: 10.
[88]
Cf. Isaías 29: 18.
[89]
Cf. Mateus 5: 3.
[90]
Cf. Isaías 29: 19.
[91]
Cf. Isaías 29: 24.
[92]
Cf. Isaías 31: 9.
[93]
Cf. Isaías 32: 6. 8.
[94]
Cf. Deuteronômio 34: 4.
[95]
Cf. Isaías 50: 4-5.
[96]
Cf. Isaías 44: 25, citado em I Coríntios 1: 20.
[97]
Cf. I Pedro 2: 9.
[98] Cf.
Isaías 45: 1-3.
[99] Jeremias 8: 8-9.
[100]
Cf. Isaías 50: 4.
[101]
Jeremias 8: 8-9.
[102]
Cf. Salmo 44 (45): 2.
[103]
Cf. Baruc 3: 14.
[104]
Jeremias 23: 28.
[105]
Jeremias 36: 2.
[106]
Cf. Jeremias 13: 23.
[107]
Cf. Jeremias 9: 4-5.
[108]
Jeremias 15: 15-21.
[109]
Cf. Eclesiástico 12: 15.
[110]
Trata-se aqui dos monges, homens que se consagraram a Deus.
[111]
Cf. Lamentações 4: 7-8.
[112]
Cf. Lamentações 4: 5.
[113]
Cf. Ezequiel 17: 24.
[114]
Cf. Ezequiel 29: 21.
[115]
Cf. Salmo 67 (68): 12.
[116]
Cf. Daniel 2: 21-22.
[117]
Cf. Tiago 1: 25.
[118]
Cf. Romanos 2: 11.
[119]
Cf. Romanos 8: 14.
[120]
Cf. II Timóteo 3: 3.
[121]
Cf. Romanos 2: 6.
[122]
Cf. Romanos 2: 28-29.
[123]
Cf. Romanos 2: 29.
[124]
Cf. Gálatas 2: 16.
[125]
Cf. Hebreus 11: 1.
[126]
Cf. Hebreus 11: 4.
[127]
Cf. Hebreus 11: 8.
[128]
Cf. Mateus 13: 52.
[129]
Cf. Hebreus 4: 3.
[130]
Cf. Hebreus 4: 10.
[131]
Cf. Hebreus 4: 18-19.
[132]
Cf. Hebreus 3: 12.
[133]
Cf. Salmo 126 (127): 2.
[134]
Cf. Hebreus 4: 9.
[135]
Cf. Hebreus 4: 11.
[136]
Cf. João 1: 29.
[137]
Cf. João 6: 58.
[138]
Cf. Romanos 6: 10-11.
[139]
Cf. Gálatas 2: 20.
[140]
Cf. Romanos 6: 13.
[141]
Cf. Romanos 6: 19.
[142]
Cf. Colossenses 3: 3.
[143]
Cf. Romanos 7: 2.
[144]
Cf. Romanos 7: 4-6.
[145]
Cf. Tito 3: 5.
[146]
Cf. Romanos 8: 23.
[147]
Cf. Romanos 8: 26.
[148]
Cf. II Coríntios 4: 10.
[149]
Cf. I Coríntios 2: 14.
[150]
Cf. I Coríntios 2: 10.
[151]
Cf. Romanos 1: 29.
[152]
Cf. II Timóteo 4: 10.
[153]
Cf. I Coríntios 2: 15-16.
[154]
Cf. I Coríntios 3: 13.
[155]
Cf. I Coríntios 3: 14.
[156]
Cf. Efésios 2: 21-22.
[157]
Cf. I Coríntios 8: 2.
[158]
Cf. Gálatas 5: 18.
[159]
Cf. I Coríntios 8: 3.
[160]
Cf. Jeremias 15: 19.
[161]
Cf. I Coríntios 10: 4-5.
[162]
Cf. Nota 518 : Trata-se aqui dos monges, homens que se consagraram a Deus.
[163]
Cf. Êxodo 19: 15.
[164]
Cf. Êxodo 33: 23.
[165]
Cf. Êxodo 19: 23.
[166]
Cf. Isaías 35: 6.
[167]
Cf. Mateus 17: 2.
[168]
Cf. Mateus 13: 52.
[169]
Cf. Lucas 6: 45.
[170]
Cf. I Coríntios 12: 3.
[171]
Cf. I Coríntios 12: 7.
[172]
Cf. I Coríntios 12: 9-11.
[173]
Cf. I Coríntios 12: 28-29.
[174]
Cf. I Coríntios 13: 4-7.
[175]
Cf. Gálatas 3: 27.
[176]
Cf. I Coríntios 13: 4-8.
[177]
Cf. I Coríntios 12: 28-29.
[178]
Cf. I Coríntios 13: 9 e 12.
[179]
Cf. I Coríntios 14: 2-4.
[180]
Cf. I Coríntios 14: 6.
[181]
Cf. I Coríntios 14: 8.
[182]
Cf. I Coríntios 14: 4.
[183]
Cf. I Coríntios 14: 19.
[184]
Cf. Romanos 2, 4 e 9.
[185]
Cf. I Coríntios 13:9-10.
[186]
Cf. Hebreus 2: 8.
[187]
Cf. I Coríntios 15: 24.
[188]
Água, terra, fogo e ar.
[189]
Cf. II Reis 2: 11. A quadriga das
virtudes consiste nas quatro virtudes fundamentais que conduzem do corpo carnal
ao corpo glorioso.
[190]
Cf. Gênesis 2: 8.
[191]
Um dos nomes de Deus em hebraico. Cf. Denis o Areopagita, Hierarquia celeste XV, 9.
[192]
Cf. Isaías 6: 3.
[193]
Cf. Apocalipse 19: 1. Cf. Denis o
Areopagita, Hierarquia celeste IV, 1.
[194]
O cumprimento da liturgia da nove ordens angélicas: Deus em si.
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