(Capítulo VI
do livro Theology and the Church –
St.
Vladimir’s Seminary Press, NY, 1980)
Em geral, a Igreja Ortodoxa não utiliza o termo “reconciliação” para
designar a totalidade da obra salvífica do Senhor Jesus Cristo e para a
apropriação dessa salvação individualmente pelos fiéis. Esse termo foi adotado
pela teologia Protestante com base em quatro textos das epístolas de São Paulo:
Romanos 5: 10[1], II
Coríntios 5: 18-20[2],
Colossenses 1: 19-23[3]
e Efésios 2: 14-18[4].
A teologia Católica Romana também faz uso do termo “reconciliação”,
mas apenas como uma expressão secundária abaixo da palavra “redenção”[5],
e ainda especificando que essa reconciliação ou redenção é obtida pela
“reparação” oferecida a Deus por Jesus Cristo. Essa reparação se distingue em
certa medida da “expiação” subjacente ao entendimento Protestante da
reconciliação.
Durante algum tempo, no passado, os manuais de teologia Ortodoxos,
aceitando o costume Ocidental, utilizaram também o termo “redenção”.
Similarmente, o conceito de reconciliação também surgiu em anos recentes na
teologia Ortodoxa, como uma expressão compartilhada com Igrejas Protestantes em
contatos ecumênicos, tanto dentro como fora do Conselho Mundial das Igrejas.
Trata-se de uma palavra que reflete ainda o entendimento comum entre Ortodoxos
e Protestantes para promover todos os esforços feitos em favor da paz. A
“reconciliação” foi aceita por teólogos Russos em seu diálogo com colegas
Luteranos, no Terceiro Encontro de Arnoldsheim, em Março de 1967, como um termo
capaz de expressar o inteiro conteúdo da obra salvífica de Cristo.
Mas podemos dizer mais genericamente que quando a teologia Ortodoxa
aceita o uso dos termos “redenção” e “reconciliação”, ela lhes dá um
significado mais amplo do que o faz o entendimento de Católicos e Protestantes.
Isso é ainda mais verdadeiro na medida em que a teologia Ortodoxa retorna às
suas bases patrísticas, aproximando-se de uma conformidade mais estreita com a
tradição litúrgica da Igreja do Oriente. Esse significado mais amplo e
multidimensional foi desde sempre expresso pela Igreja Ortodoxa pelo termo
“salvação”, e esse segue sendo o costume preferido pela Igreja Ortodoxa, por
muitas razões. Em primeiro lugar, trata-se da palavra que encontramos com mais
frequência no Novo Testamento, tanto como denominação da obra realizada pelo
Senhor Jesus Cristo (swthria – cerca de
40 vezes), quanto como título dado a Cristo em função da obra realizada (swthr – cerca de 20 vezes). Em segundo lugar,
e sempre seguindo o exemplo do Novo testamento, “salvação” é o termo mais
utilizado pela Igreja na sua tradição e no seu culto. Ele é encontrado, por
exemplo, seja no Credo Niceno-Constantinopolitano, seja nas orações dos fiéis.
Finalmente, ela expressa o mais profundo, mais compreensível e multidimensional
significado da obra realizada por Jesus Cristo. Nessa última dimensão, vale
dizer, entendida como a destruição da morte do homem em todas as suas formas e
a certeza da vida plena e eterna, a palavra “salvação” produz no fiel Ortodoxo
um sentimento de absoluta gratidão para com Cristo, a quem ele deve a
libertação de sua existência e a esperança da vida eterna e da felicidade. Esse
é um fato que não pode ser passado por alto.
É a perspectiva da Igreja Ortodoxa, bem como da Igreja primitiva, que
a palavra “salvação” não apenas abarca o significado profundo, completo e complexo
da atuação de Cristo, mais do que qualquer outra palavra, como ela ainda contém
em si os diversos significados parciais da salvação que aqueles outros termos
expressam. Ela inclui as ideias de “vida”, de “vida eterna” e do “Espírito”,
que, juntamente com a multitude de seus dons, são concedidas àqueles que creem.
Ela ainda inclui aquilo que é expresso pelas palavras “união com Cristo” e
“vida em Cristo”[6],
pela “adoção”[7],
pela configuração do homem à imagem de Cristo[8],
pela “conformação no mesmo corpo com Cristo”[9],
pela “comunhão com o Pai e o Filho”[10],
pela “comunhão com o Espírito Santo”[11],
pelas condições de “justiça”, “santidade” e “filiação divina”[12],
pela “participação na natureza divina”[13],
pelo renascimento no Espírito e a “herança do que é imperecível, incorruptível
e inapagável”[14].
A riqueza de nossa salvação por Cristo é tão grande que não pode ser
completamente expressa por uma única fórmula, nem por todas elas conjuntamente.
Trata-se de um mistério que jamais pode ser completamente entendido ou definido.
São Gregório de Nazianze, por exemplo, depois de ter tratado brevemente da obra
de salvação realizada por Cristo, declara: “Respeitemos com nosso silêncio
aquilo que falta”, pois “nada pode se igualar ao milagre de minha salvação”. O
uso exclusivo de qualquer termo, especialmente se ele se tornar a chave para a
interpretação de todos os outros termos, irá inevitavelmente nos encerrar numa
compreensão extremamente limitada de seu mistério inefável. Vladimir Lossky
comenta o texto de São Gregório de Nazianze acima da seguinte forma: “Depois do
horizonte restrito de uma teologia exclusiva e jurídica, redescobrimos nos
Padres uma noção extremamente rica da redenção que inclui a vitória sobre a
morte, as primícias da ressurreição geral, a libertação da natureza humana do
mal, e ainda não apenas a justificação, como a restauração da criação em
Cristo”.
Cada um desses termos é precioso porque coloca em relevo algum dos
aspectos da salvação que Cristo trouxe a nós. É preciso, assim, considerar toda
a linguagem bíblica para o entendimento da salvação, mas, ao mesmo tempo,
devemos evitar forçar tudo no confinamento de uma simples e única palavra. Se
existir a necessidade de empregar uma expressão mais geral, devemos escolher
uma palavra que já seja a mais abrangente e que assim amplie seu sentido a
ponto de incluir em si o significado de todas as demais. Em qualquer caso,
precisaremos explicar cada termo em harmonia com todos os outros.
O valor específico do termo “reconciliação” está em que ele enfatiza o
caráter tanto do homem como de Deus enquanto “pessoas”, na economia da
salvação, do mesmo modo como a palavra “salvação” tomada em si sugere a
libertação em relação a certos poderes malignos ou situações urdidas por forças
impessoais ou pelas próprias ações humanas. A expressão “reconciliação”, por
sua vez, torna claro que a salvação acontece pelo restabelecimento de uma
relação pessoal normal entre o homem e Deus, pelo restabelecimento – por
intermédio de um ato realizado em Cristo pelo Deus pessoal – de uma relação de
paz entre Deus enquanto pessoa e o homem enquanto pessoa. Foi provavelmente por
esse motivo q eu Lutero preferiu falar em “reconciliação”, embora, como vimos,
o fiel Ortodoxo possa também experienciar sua “salvação” como a mais completa
libertação de sua existência pessoal em relação aos poderes de destruição e,
por conseguinte, como uma relação cotidiana profundamente pessoal com Deus.
A escolha da “reconciliação” por Lutero, como sendo a mais adequada e
sensível expressão do relacionamento pessoal entre o homem e seu Deus, chegou
num tempo em que o homem despertava para uma consciência excepcionalmente aguda
de seu próprio destino enquanto indivíduo, e também para uma ansiedade
igualmente aguda quanto à medida de sua paz com Deus, e também sobre o quanto,
dada a imperfeição ética de sua vida, ele poderia ser considerado justo perante
Deus. Se num período anterior o homem se satisfazia em conhecer uma redenção
objetiva dentro de uma estrutura coletiva, e contentava-se com que isso fosse
expresso pela primitiva linguagem soteriológica da destruição universal do
pecado e da morte ante a perspectiva vindoura de uma ressureição geral, no
tempo de Lutero o homem acordava para a consciência de sua própria
individualidade e começava a buscar acima de tudo a certeza de uma paz interior
e pessoal com Deus, a segurança de que Deus se voltava amorosamente para ele
como uma pessoa única, apesar do fato de ser o homem incapaz de abandonar sua
condição pecaminosa. Num documento intitulado “A reconciliação por meio de
Cristo e a paz do mundo”, o professor E. Wolf de Göttingen escreveu: “A paz da
consciência, e mesmo uma boa consciência perante Deus, constitui assim as
primícias da reconciliação. Portanto, é assim que Cristo nos torna confiantes
diante de Deus e em paz com nossa consciência”.
Foi provavelmente pela mesma razão que Lutero aproximou tanto os
termos “reconciliação” e “justificação”, convicto de que eles continham toda a
herança do homem, como resultado da ação por meio da qual Deus reconcilia o
homem consigo próprio. O homem da Renascença, com seu alto grau de consciência
de si, percebia que a causa de sua carência de paz interior com Deus respondia
pela carência de sua própria retidão diante da face de Deus. Ele se dava conta
de que não poderia adquirir nenhuma retidão pessoal intrínseca, e assim
encontrava consolo ou confiança na noção de que seria considerado justificado
por Deus graças ao sacrifício expiatório oferecido por Cristo a Deus em
benefício do homem. Dessa maneira, na ideia de “justificação” aparece em relevo
a salvação como a restauração de uma relação pessoal do homem com Deus.
Ao mesmo tempo em que reconhece a importância da ênfase de Lutero na
condição de salvação que Cristo trouxe para nós, a Igreja Ortodoxa também crê
que o homem é capaz de crescer continuamente na nova vida em Cristo, tal como
descrito pela Escritura e pelos Padres, e que o fundamento de seu crescimento,
o fundamento da nova e verdadeira vida do homem, está no relacionamento de paz
entre este e Deus, que agora pode ser experimentado conscientemente pelo homem
como resultado do sacrifício de Cristo. Obviamente, esse crescimento espiritual
não acontece no auto isolamento, mas no bojo de um diálogo de paz restabelecido
com Deus. Porque aquilo que o homem experimenta nesse diálogo não constitui uma
paz exterior e formal, mas consiste numa força que cresce dentro dele, preservando-o
nessa paz e produzindo mais e mais frutos. Esses frutos, por sua vez,
representam a retidão que aumenta até se tornar a expressão da soma de todas as
virtudes. Essa é a retidão, tal como entendida pelo Antigo e o Novo
testamentos. É assim que o próprio Cristo é chamado “justo”[15];
aí lemos ainda sobre o poder da oração do homem justo[16];
aí está a demanda para que o homem justo se torne ainda mais perfeito[17],
e ainda para que ele não pratique sua justiça diante dos homens[18].
Parece-nos que atualmente a teologia Protestante vem se desenvolvendo
cada vez mais na direção dessa semente contida em todo o ensinamento de Lutero,
e assim, ela vem se movendo na direção de um encontro com o ensinamento
Ortodoxo. Por outro lado, a teologia Ortodoxa enfatiza que a nova vida do homem
não é produzida pelo próprio esforço do homem, mas pelo poder que ele recebe de
seu diálogo com Deus. Essa ênfase fica clara no trecho a seguir, extraído do
documento do Prof. Wolf: “Graças ao ato de reconciliação de Cristo, essa paz já
é uma realidade oculta; ela se torna efetiva na comunidade Cristã, e, através
dela, para todo o mundo”. Uma vez que percebamos a justificação concebida no
ensinamento de Lutero como algo que é organicamente unido à paz, podemos dizer
que a retidão que Cristo concede como um dom a todo homem é precisamente essa
realidade oculta. Para que ela se torne efetiva dentre os membros da comunidade
eclesial e, através dessa comunidade, para todo o mundo, essa paz e a retidão
implicada nela devem possuir a natureza de uma força que, embora vinda de Deus,
não deixa de ser manifestada através do homem e que é assimilada como um
reflexo divino pelo sujeito humano em seu diálogo com Deus. Esse reflexo pode e
deve ser ativado por nós, fiéis; de fato, é nossa responsabilidade considerá-lo
como ativo.
A doutrina Ortodoxa da salvação em Cristo
A seguir faremos uma breve
descrição da vida nova e do poder que o Filho de Deus encarnado, crucificado,
ressuscitado e exaltado, concede a nós, por intermédio do Espírito Santo, como
constituindo a “salvação”, de acordo com o entendimento Ortodoxo dessa palavra.
O Filho de Deus comunicou sua vida e seu poder em sua plenitude escatológica à
humanidade que assumiu, e os comunicou a nós por graus através de sua própria
humanidade; e nós os recebemos como um princípio de crescimento, como um dom e
uma promessa que implicam um desenvolvimento escatológico e, portanto, uma
esperança. Pois na medida em que Cristo é “cheio de graça e verdade”, na medida
em que Ele é “perfeito homem”, temos aí apenas as primícias de sua plenitude, e
devemos crescer Nele como perfeito homem[19],
de acordo com a estatura da plenitude de Cristo[20].
A vida e o poder comunicados por Cristo à Sua humanidade se manifestaram em
três direções: para Deus, para a natureza humana em si, e para seus queridos
seres humanos. Essa nova vida e esse
poder que o Filho do Homem, através da humanidade que Ele assumiu, comunica
àqueles que Nele acreditam, também se manifestam nas mesmas três direções. E
assim como o Filho de Deus os comunicou à Sua humanidade assumida por meio de
sua encarnação, crucificação, ressurreição e ascensão, da mesma forma ele os
comunica aos que Nele acreditam, vale dizer, por intermédio dos atos que ele
realizou e pelo estado que Ele atingiu enquanto homem.
Devemos mencionar o fato de que nos últimos três ou quatro séculos a
teologia Ortodoxa sofreu uma certa influência escolástica em seu ensino
soteriológico, e que assim chegou a apresentar a salvação como algo adquirido
exclusivamente por meio da cruz de Cristo, e a entender a salvação em geral
como uma satisfação vicária[21]
oferecida a Deus por Cristo. Todavia, a começar pela teologia Russa no século
XIX, a teologia Ortodoxa retornou quase completamente ao entendimento estrito
da salvação próprio dos Padres Gregos, e, sob a influência do ministério, ou Diaconia, mundial que a Igreja assumiu,
a teologia Ortodoxa de anos recentes desenvolveu em uma forma contemporânea
essas dimensões pan-humanas e cósmicas da salvação que são também parte da
herança patrística.
Vamos agora considerar a vida nova e o poder que Cristo nos concedeu,
e o modo como isso se manifesta por intermédio de sua encarnação, crucificação,
ressurreição e ascensão.
A)
Desde a sua encarnação o Filho de Deus trouxe ao
homem uma nova vida e um poder em suas relações para com Deus, para consigo
mesmo e para com seu próximo. Cristo uniu a humanidade com Deus através da
encarnação de uma maneira que é não apenas íntima, como ao mesmo tempo
indissolúvel, inseparável e definitiva. O Filho de Deus fez com que o homem se
tornasse, mesmo em sua qualidade de homem, Filho de Deus. Seu amor filial e
eterno ao Pai encheu também toda a humanidade, e assim, como diz São João
Damasceno, “a encarnação constituiu uma modalidade da segunda subsistência
pessoal, adaptada exclusivamente ao Filho Unigênito de tal maneira que seu
atributo individual pessoal permaneceu inalterado”. Somente o Filho seria capaz
de preencher a humanidade que Ele assumiu com o amor filial ao Pai, e, através
de Sua humanidade, encher cada homem que se une a Cristo pela fé, com o mesmo
amor filial. O desejo humano se torna a vontade do Filho de Deus, que o dirige
em direção ao Pai com seu amor filial. De acordo com São Máximo o Confessor,
Cristo possuía uma vontade humana natural, mas, devido ao fato de que o sujeito
– ou hipóstase – que sustentava Sua natureza era o próprio Logos, ele não
poderia ter uma vontade gnômica, sentenciosa ou aforismática. Aqueles que
atribuem uma vontade gnômica a Cristo pensam que, tal como nós, ele teria uma
vontade que seria “ignorante, hesitante e em conflito consigo mesma [...] Na
humanidade do Senhor, que não tinha apenas uma hipóstase humana, mas uma
hipóstase divina [...] não se pode dizer que houvesse uma vontade gnômica”,
vale dizer, uma vontade que se movesse independentemente da hipóstase divina e
que fosse capaz de tomar decisões contrárias à vontade divina. Isso implica uma
perfeita obediência ao Pai por parte do Cristo encarnado. Sua vontade humana
era movida por sua hipóstase divina em conformidade com sua própria vontade
divina, e a partir daí, com a vontade do Pai. Dessa maneira, Cristo dava ao Pai
a perfeita glória sobre a terra também como homem. Em todos os movimentos de
sua vontade humana, em todas as suas ações – e, portanto, também em seus
pensamentos – Cristo era completamente devotado ao Pai.
Isso implica a completa santificação da humanidade que Ele assumiu.
Toda a santidade de Sua divindade se tornou própria de Sua humanidade e tomou a
forma humana. Cristo é santo em seus pensamentos, nos movimentos de sua
vontade, em seus sentimentos e, por conseguinte, em sua carne. Ele se tornou o
segundo Adão, ultrapassando o primeiro Adão em pureza, mesmo em relação ao
estado de Adão anterior à Queda. Embora Cristo tenha carregado ao assumir sua
natureza [humana] os efeitos e a opressão das necessidades sofridas por Adão
depois da Queda, não obstante Ele próprio não estava sujeito à queda. Ao
contrário, Ele exerceu a maestria do espírito sobre essas fraquezas; ele
libertou a natureza da opressão que lhe havia sido imposta por elas e nos
concedeu também o poder de fazer o mesmo.
Ele é a segunda raiz da raça humana, de acordo com São Cirilo de
Alexandria, uma nova raiz que se mantém nova permanentemente, e da qual
qualquer filho do primeiro Adão pode ser renovar continuamente, nascendo do
Espírito do segundo Adão e permanecendo para sempre unido a Ele mesmo diante de
qualquer deslize, como em relação a uma fonte revivificadora. “Embora o homem
tenha se afastado de Deus e o tenha afligido por conta de sua desobediência e
de seus inúmeros pecados, Cristo o restabeleceu perante a face de Seu Pai em Si
próprio, como no primeiro homem”. Em Cristo o homem foi trazido novamente aos
olhos de Deus. “Em Adão a raiz da raça humana, como uma mãe, morreu; mas os que
vieram daí depois – ou seja, nós próprios – rebrotamos renovados em Cristo, e
existimos e somos salvos na medida em que temos a Ele como nossa vida e nossa
segunda raiz”. Ele é, como dizia São Gregório Palamas, “o novo Adão que nasceu
depois, mas que é a fonte a partir da qual o mundo é continuamente renovado”.
Devido ao amor filial de Cristo pelo Pai e por causa de sua perfeita
divindade, o Pai olha para a face humana de Cristo com o mesmo amor com que
olha para Seu Filho Unigênito. Dessa maneira, tendo Seu Filho se tornado homem,
Deus renovou a raça humana; Ele a reconciliou verdadeira e radicalmente consigo
mesmo e a justificou de modo absolutamente real. Sustentada pela hipóstase
divina do Filho, a natureza humana se tornou realmente santa e justa desde sua
raiz. Sua paz com Deus reside no amor filial que Cristo, enquanto homem, tem
por Seu Pai, e isso significa que a natureza humana foi restabelecida com o
consentimento de sua própria vontade. Justiça e paz não lhe foram impostas
contra sua vontade, nem permaneceram externas a ela; antes, elas foram
assimiladas interiormente, assim como o solo seco assimila a umidade da chuva,
mesmo que essa necessariamente tenha que vir do alto. Cristo “restabeleceu a
natureza humana em conformidade consigo mesmo”, escreveu Máximo o Confessor, e
ao se tornar homem Cristo preservou a livre vontade libertando-a das paixões e
estabelecendo-a em paz com a natureza. É precisamente por meio dessa
harmonização da vontade com a natureza que a reconciliação do homem com Deus
pode ser adquirida. “Assim como a inclinação da vontade une a si mesma dessa
forma com o logos da natureza, da
mesma forma se produz a reconciliação de Deus com a natureza”. Mas isso só pôde
ser adquirido pelo homem depois de ter se realizado em Cristo, em quem a
vontade humana era a vontade de hipóstase divina. Somente pelo fato de que a
hipóstase divina preencheu a natureza humana, que ela harmonizou a vontade
humana com a natureza humana e conduziu a vontade simultaneamente à harmonia
com Deus – que deseja apenas o que está em conformidade com a natureza humana,
e que é o único que verdadeira deseja isso. Por meio da encarnação o Filho de
Deus restaurou no homem “a grandeza da imagem divina”, porque ele possuía a
razão não escravizada pelas baixas afeições e impulsos opostos a Deus. “O Verbo
de Deus”, diz Santo Atanásio, “veio em Sua própria Pessoa, porque somente Ele,
a Imagem do Pai, poderia recriar o homem segundo a Imagem”.
A verdadeira paz e justiça que Cristo, por meio de sua encarnação como
homem, partilha com Deus, se torna para aqueles que Nele creem uma paz e uma
justiça verdadeiras através de sua união com Cristo. Pois o relacionamento
entre o Pai e o homem Jesus inclui em si, primeiro potencialmente mas
progressivamente também em ato, todos aqueles que acreditam em Cristo. A
divindade de Cristo enquanto homem está ao alcance de todos, e está dirigida
direta e ativamente para todos. Se de modo geral é verdade que o santo é um
homem para os homens, o homem que é estranho a qualquer tipo de individualismo
ou egoísmo, mais verdade ainda é que Cristo, mesmo em sua humanidade – que não
é sustentada por uma hipóstase humana, mas por uma hipóstase divina – não pode
ser encerrado dentro de si numa espécie de individualismo, mas, graças à divina
hipóstase que é o Deus de todos, comunga a si próprio com todos com sua
divindade e perfeita generosidade. “Em favor deles Eu me consagro, para que
eles possam ser consagrados na verdade[22]”.
Num relacionamento de união com Cristo em que a vontade humana é a pura vontade
da divina hipóstase, também o resto dos homens podem se tornar santos. A
vontade humana cortou os laços de unidade entre os homens por sua própria
escolha arbitrária e egoísta. Em Cristo, a vontade humana abandona sua escolha
e se conforma não apenas com a vontade de Deus, como com a natureza humana, com
aquilo que em verdade promove a vida para todos os homens. Por essa razão
aqueles que estão unidos a Cristo já não trabalham pelo desmembramento da
sociedade, mas para a fraternidade entre os homens.
Por intermédio de suas vontades humana e divina, ambas guiadas pelo
amor, Cristo exerceu e ainda exerce, cada vez mais, no presente, uma influência
unificadora sobre a humanidade. “O Verbo não ficou limitado ao seu corpo”, diz
Santo Atanásio. “Presente em toda parte [do universo] e além, ele se revela
tanto pelas ações de seu corpo, como pela sua atividade no mundo”.
A importância que o Oriente dá à encarnação do Senhor para a
unificação da espécie humana se deve, por um lado, à hipóstase divina que
assumiu a natureza humana de Cristo, e, por outro, à doutrina das energias
incriadas. A hipóstase divina se abre ativamente pela humanidade [de Cristo]
porque essa última não está encerrada dentro de uma hipóstase humana, portanto
não se encontra sujeita às limitações da natureza criada. A humanidade do
Verbo, hipostatizada Nele e penetrada por sua energia, constitui o fermento que
opera secretamente dentro da totalidade do corpo da espécie humana, e é o
fundamento da doutrina da deificação do homem, um ensinamento tão caro aos
Padres Gregos. “É no contexto desse pensamento de Cirilo que se pode entender o
que Leôncio de Jerusalém quis dizer quando falou da hipóstase comum de Cristo: uma
hipóstase que, ao invés de ser mais uma hipóstase isolada e individualizada
dentre todas as hipóstases que constituem a natureza humana, é a hipóstase
arquetípica de toda a espécie humana. Nela, a humanidade “recapitulada”, não
apenas enquanto indivíduos, recupera sua união com Deus. Isso só é possível na
medida em que a hominidade de Cristo não consiste na natureza humana de um mero
homem, mas em uma hipóstase independente das limitações da natureza criada”.
Pode-se dizer que Cristo é a hipóstase central que conecta todas as hipóstases
humanas umas às outras, porque primeiro Ele as conecta consigo mesmo.
A encarnação é uma espantosa kenosis
do Filho de Deus por meio da qual ele se tornou a hipóstase tanto das afeições
que escravizam a natureza humana como das limitações que a confinam, a fim de
libertar a natureza humana das primeiras e romper as barreiras da segunda. Mas
a encarnação é também uma kenosis da
humanidade em Cristo, a qual não possui sua existência autônoma em sua própria
hipóstase, mas na hipóstase divina – uma kenosis
que é inteiramente dedicada a Deus. O esvaziamento de si é tanto um sinal de
amor, que sem ele o amor não pode ser manifestado. Pois no amor a pessoa
esquece de si e se entrega por inteiro à outra numa rendição total; e somente
por meio desse amor é possível revelar-se a si mesmo em sua própria plenitude.
“Pois na medida em que o homem não existe senão na medida em que abandona a si
mesmo, a encarnação de Cristo surge como o exemplo supremo e único da plenitude
essencial da realidade humana”. A partir desse supremo foco de amor divino –
que igualmente eleva o amor humano ao mais alto grau e que se mantém aberto
para todos os homens, tomando seu lugar dentre eles – o amor brilha entre nós e
nos arrebata em seu próprio movimento interior.
A importância da encarnação para o entendimento de nossa salvação em
Cristo fica clara a partir do que foi escrito acima, mas existem ainda outras
dimensões da encarnação. Se virmos apenas a cruz de Cristo e não sua vida
terrena enquanto Deus feito carne, ficaremos sem os ensinamentos de Cristo e o
exemplo de sua vida. Essas coisas não apenas nos revelam o significado da cruz,
como ainda nos ensinam e nos encorajam a viver uma vida de obediência a Deus,
uma vida de pureza e de amor ativo a serviço de nosso próximo. Santo Atanásio
insiste sobre esse fato: “O homem deus as costas à contemplação de Deus nas
alturas, e passou a olhar para si na direção oposta, para baixo, entre as
coisas criadas e o mundo dos sentidos. O Salvador de todos nós, o Verbo de
Deus, em seu grande amor, tomou para si uma corpo...”. Deus, vendo o homem
vagando no erro não quis deixar que se perdesse aquele que um dia participou de
Sua imagem, mas quis que essa imagem fosse renovada nele para que, através
dela, os homens voltassem a conhecê-lo. “Assim é que o Verbo de Deus veio em
Sua Pessoa, pois somente Ele, a Imagem do Pai, poderia recriar o homem a partir
dessa Imagem”.
Através de sua vida terrestre em um corpo, o Filho de Deus deixou
claro de modo geral o valor de nossa existência na terra para adquirir a
salvação. Ele mostrou como devemos nos esforçar enquanto estamos por aqui para
obtermos uma profunda reconciliação com Deus e com nosso próximo, uma reconciliação
cheia de amor. O fato de que Deus se abriu, de modo pessoal e hipostático, para
criar a existência terrestre, e concordou em vivê-la em nosso favor, prova que
essa existência possui valor mesmo para Ele. Santo Atanásio diz que no
princípio o homem foi criado por um decreto da vontade de Deus. “Mas uma vez
que o homem passou a existir, e as coisas que existiam – não as coisas que não
existiam – pediam para ser curadas, seguiu-se logicamente que o médico e
Salvador deveria alinhar-se com aquelas coisas que existiam, a fim de poder
curar o mal existente. Por esse motivo Ele se fez homem, e serviu-se do corpo
como de um instrumento humano [...] abrindo-se, por meio disso, a todos”. Não
era seu desejo conduzir-nos à vida eterna sem nenhuma consideração por nossa
vida terrena. Essa vida teria que ser também santificada como uma condição para
a vida eterna. Tomando na sua base a sugestão de São Paulo, de que devemos
crescer no amor a fim de “compreender o que é a largura, o comprimento, a
altura e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo que ultrapassa todo
conhecimento[23]”,
Santo Atanásio diz: “A auto revelação do Verbo se dá em todas as dimensões:
acima, na criação; abaixo, na encarnação; na profundidade, no Hades; na
amplitude, por todo o mundo. Todas as coisas estão cheias do conhecimento de
Deus. Por esse motivo Ele não ofereceu o sacrifício em favor de todos
imediatamente ao chegar, pois se Ele tivesse se entregado à morte e se
levantado a seguir Ele teria deixado de ser objeto de nossos sentidos. Ao invés
disso, Ele permaneceu em seu corpo e se deixou ver nele, realizando ações e
deixando sinais que mostravam não ser Ele apenas humano, mas Deus o Verbo”
[...] “...o Verbo aceitou aparecer num corpo, para que, como homem, pudesse
concentrar os sentidos de todos em si, e convencer a todos, por meio de suas
ações humanas, de que ele não era somente homem, como também Deus...”. O Filho
de Deus não desdenhou a vida humana na terra como indigna ou insignificante; ao
contrário, ele adotou-a para si, de tal modo que, no decurso dessa própria vida
a cura e a santificação do homem pudesse ter seu início.
B)
Mas das três maneiras pelas quais a nova vida e
o poder de Cristo se manifestam, existem mais coisas na sua morte na cruz, por
meio da qual Cristo efetuou a restauração da natureza humana. A cruz de Cristo
representa um novo passo na obra de nossa salvação. Sem a cruz de Cristo, a
salvação não poderia ter se efetivado. Com sua morte, Cristo se entregou ao Pai
não apenas por meio de uma vida exemplar mas ainda pela completa renúncia à
vida em si. Como homem Ele entregou tudo a Deus e não deixou nada para si
próprio. Na sua morte, a kenosis
amorosa atingiu seu clímax. São Cirilo de Alexandria desenvolveu a ideia de São
Paulo de que o homem só pode se apresentar a Deus na condição de vítima
imaculada, mas que nós não estamos em condições de levar ao Pai tal oferenda.
Assim sendo, Cristo, enquanto homem, ofereceu o sacrifício imaculado ao Pai,
não com a intenção de apresentar ao Pai alguma espécie de equivalente jurídico,
mas para nos dotar, mediante nossa união com ele, da capacidade de nos
tornarmos, nós próprios, vítima imaculada, para podermos entrar com Ele na
presença do Pai. Dessa forma, nós obtemos acesso ao Pai por intermédio da Cruz
de Cristo, através de Seu corpo crucificado na cruz. “Pois através Dele temos
acesso num único espírito ao Pai[24]”.
Apenas se Cristo está em nós como vítima imaculada, ou se estamos nós nele – o
único que possui a condição de vítima impecável – podemos ter acesso ao Pai. E,
junto com esse acesso, de acordo com São Paulo, também obtemos a reconciliação
ou a paz entre nós e entre nós e Deus. Pois através da cruz de Cristo, de sua
suprema entrega enquanto homem, a hostilidade que reside em nosso interior
chegou ao fim[25].
E ao mesmo tempo, em seu corpo sacrificado na cruz (e, portanto, na condição de
suprema entrega ou kenosis amorosa
perante Deus em nosso favor), nós, suas criaturas mais amadas, reconciliamo-nos
entre nós e também com Deus. É admirável o modo como São Paulo liga a
reconciliação e a paz entre a espécie humana e Deus, com o acesso ao Pai, e
como, para ele, essa reconciliação implica também que aqueles que eram hostis e
inimigos uns dos outros são agora reconstruídos em um novo homem. O poder para
realizar tais coisas se encontra na cruz de Cristo, em seu sacrifício
totalmente puro, a completa entrega de si. Esse sacrifício olimpo, como um
holocausto oferecido ao Pai com fragrância de suave olor, não é outra coisa
senão sua total rendição ao Pai. São Cirilo diz que onde quer que exista
pecado, não pode haver aí um sacrifício que seja puro. O sacrifício é a
rejeição de todo individualismo egoísta, que é a forma real do pecado. Ele
consiste na rendição total ao Pai, e somente Cristo foi capaz de oferecer tal
sacrifício. Ele fez isso de modo a criar em si mesmo enquanto homem a condição
de completa submissão ao Pai, para que assim, como um ímã, pudesse nos atrair
para sua própria condição, de modo a formar Sua imagem em nós, a imagem de Si
no estado sacrificial[26].
“É coisa certa que o pecado que existe em nós é uma coisa triste e que cheira
mal... Mas em Cristo essa vida de tristeza e mau odor se transforma em alegria.
A fé derrama aí uma doce fragrância. Através de Cristo nós nos oferecemos a
Deus. Pois é ele quem purifica os pecadores e lava espiritualmente aqueles que
estão manchados... Através de Cristo oferecemos a nós mesmos, através dele
ousamos nos aproximar. Mas nos aproximamos pela fé, e nos oferecemos ao Pai com
uma doce fragrância, apenas se cessarmos de existir apenas para nós mesmos, se
tivermos em nós somente a Cristo, como o suave sabor do Espírito”. E esse suave
sabor é a morte de Cristo.
Nesse sentido, morremos também nós no batismo à semelhança da morte de
Cristo, ou melhor, somos enraizados na semelhança dessa morte, tendo sido
enterrados em Sua morte[27].
Assim nos tornamos justos em Cristo perante o Pai. Não se trata de uma justiça
de vanglória, mas de nossa rendição a Deus. Pois a verdadeira união no amor, ou
no diálogo do amor, só vem por meio da total submissão. É somente nessa
rendição em Cristo quer nos reconciliamos com Deus, somente nessa condição
sacrificial recebemos a santidade de Deus, uma santidade que só existe na
transcendência total de todo egoísmo, raiz do pecado. É nessa santidade que
consiste nossa justiça perante o Pai, a justiça que adquirimos por intermédio
de Cristo. Obtemos essa santidade, ou essa justiça, do Pai, pois quando
entramos por meio de Cristo na presença do Pai num estado de puro sacrifício,
somos estabelecidos numa condição na qual se torna possível uma plena
comunicação com Deus. E, como apenas nesse estado de total rendição em Cristo
somos reconciliados com Deus, podemos dizer que essa reconciliação demanda
sacrifício, o sacrifício de nossa própria existência, essa mesma existência que
tentamos reter e tornar boa apenas para nós quando nos encontramos numa
condição de pecado e egoísmo individualista. Assim o fundamento de nosso
próprio sacrifício e fonte de seu poder, a fonte de nosso amor a Deus que
constitui a verdadeira vida, é o sacrifício de Cristo, sua imaculada entrega ao
Pai realizada no amor ao Pai e a nós, e no amor ao Pai que Ele teve em nosso
favor enquanto homem. Comungando da morte de Cristo, “comungamos de uma morte
que traz a vida”.
É claro que essa concepção do sacrifício implica a visão ascética de
São Paulo e dos Padres de acordo com a qual a queda de Adão na carne de tornou
o trono do pecado por intermédio dos apetites que operam aí. Essa carne deve morrer para que o pecado morra
com ela. Também é claro, todavia, que a carne de Cristo não constituía o trono
para esse tipo de apetites, e assim ela jamais foi sede do pecado. Ele levou à
morte mesmo as afeições sem pecado que ele assumiu juntamente com o corpo. E
assim ele crucificou a carne na cruz de modo a que seu corpo crucificado
pudesse se tornar a fonte de mortificação para nossos próprios corpos. Como diz
Nicholas Cabasilas: “Essa morte, na medida em que foi uma morte, acabou com a
vida do pecado. Na medida em que foi uma punição, removeu a culpa do pecado que
cada um de nós carrega por conta de suas más ações”. Tal é o estado de justiça
que Cristo conquistou para nós na cruz, a reconciliação das duas partes do
homem – o espírito e a carne – por meio da reconciliação com o Pai, e o fim de
toda hostilidade[28].
Essa visão da crucificação significa que o corpo de Cristo deveria conter
potencialmente todos os corpos, e que todos os homens deveriam ser arrastados
ao estado sacrificial de Cristo. “Assim ele morreu por todos, de modo que os
vivos possam viver, não mais para si, mas para Ele que, por sua salvação,
morreu e se reergueu. Portanto, se alguém está em Cristo, nova criatura é[29]”.
Nesse sentido, embora Cristo já não morra tal como um dia morreu na
terra, ele não obstante mantém permanentemente sua disposição de total entrega
ao Pai de modo a conduzir todos os homens para essa mesma condição. “Cristo
desejou preservar em seu corpo o testemunho de seu sacrifício e suportar em sua
própria pessoas as cicatrizes e as feridas que recebeu na crucificação. Desse
modo Ele quis mostrar que quando vier novamente numa luz deslumbrante ele permanecerá
sendo para seus servidores o mesmo Senhor, crucificado e ferido, e essas
feridas servirão como seus ornamentos reais”.
Uma vez que a morte entrou no mundo pelo pecado, e que Cristo não
cometeu pecado, foi por conta de nossos pecados que ele morreu na cruz. E por
meio de sua morte o pecado e o egoísmo foram destruídos até a raiz, juntamente
com o fruto que produziram, a morte. Todos os homens podem escapar a essas
coisas, desde que se enraízem na morte e no sacrifício de Cristo. Ao oferecer
Sua humanidade em sacrifício ao Pai, o Filho a elevou a um estado de suprema
perfeição, de modo a que, a partir desse estrado de perfeita plenitude, todos
os homens possam resgatar sua própria perfeição junto com a liberdade, do poder
do pecado e da morte eterna. Vemos assim que esse entendimento do sacrifício
como o dom imaculado de si ao Pai pressupõe a encarnação do Filho de Deus, pois
somente na Sua hipóstase divina a espécie humana era capaz de apresentar a si
mesma como uma oferenda perfeita ao Pai.
C)
C. Se São Cirilo de Alexandria enfatiza o
sacrifício e morte de Cristo numa perspectiva teocêntrica – como fariam Anselmo
e Lutero depois dele –, Santo Atanásio, São Máximo o Confessor e outros Padres
enfatizam a direção antropocêntrica, seu poder de curar e fortalecer a natureza
humana, seu poder de sobrepujar o pecado e a morte. Temos nesses autores uma
espécie de antropocentrismo da graça. Deus, em seu grande amor por nós, não se
preocupou consigo sequer no menor grau, mas apenas conosco.
Entre essas duas explanações sobre a morte do Senhor, a teocêntrica e
a antropocêntrica, devemos situar a explicação de São Gregório de Nazianze, que
serve como uma espécie de ponte entre elas, rejeitando a teoria de um resgate,
seja devido ao diabo, seja a Deus, ele diz: “Não está claro que o Pai recebe o
sacrifício, não porque precise, mas porque em seu plano era necessário que o
homem fosse santificado por meio da humanidade de Cristo, e para que Deus pudesse
nos chamar para si por intermédio de Seu Filho, o Mediador, que preencheu a
tudo pela glória do Pai?”.
De acordo com Santo Atanásio, São Máximo e outros Padres, o sujeito
imortal aceita a morte em seu corpo para sobrepujar a morte. A morte de Cristo
foi a ocasião da luta vitoriosa da natureza humana, suportada pela hipóstase
divina, em sua batalha contra seu mais poderoso adversário. Foi a ocasião para
o supremo esforço da natureza humana e do espírito que nela reside. “Aconteceram
então simultaneamente duas maravilhas opostas: a morte de todos foi consumida
no corpo do Senhor; e também, porque o Senhor estava nele, a morte e a
corrupção foram no mesmo ato completamente abolidas”. A cruz de Cristo foi a
ocasião da revelação do poder de Deus e de seu amor pelo homem que fora
submetido à morte devido ao pecado, e foi a ocasião para a destruição da morte.
A maioria dos Padres Gregos sublinhou esse entendimento da morte de
Cristo a fim de ligar essa morte mais estreitamente à Sua ressurreição, bem
como à Sua encarnação. De fato, eles nunca falam da morte de Cristo sem fazer a
conexão com a ressurreição e sem apresentar essa vitória como um ato do Verbo
encarnado. Cristo aceita a morte de maneira a destruí-la por meio de Sua
ressurreição, mas isso só acontece porque ele era o Verbo de Deus. Os Padres
não falam da morte de Cristo como um evento independente da ressurreição e ada
encarnação. Assim sendo, se a encarnação é o fruto do amor de Deus pela
humanidade com a qual Ele se une definitiva e indissoluvelmente, e se na paixão
esse amor é levado ainda mais longe, então sua finalidade e seu resultado podem
ser vistos na ressurreição que conduz à perfeição a união de Deus conosco por
toda a eternidade. Cristo não se encarna e morre simplesmente em função de uma
reconciliação externa conosco e para que nos tornemos justos perante Ele. O propósito
da encarnação foi a nossa libertação da morte eterna, nossa completa e eterna
união com Ele na condição de paz que é constituída precisamente pela mais
completa união amorosa entre Ele próprio e nós, uma condição na qual vivemos
Sua total justiça e divindade em união com Ele. Se o Pai ama a face de todos os
homens quando a contempla na face de Seu Filho encarnado, então, na face do
Cristo crucificado e ressuscitado a face da espécie humana aparece ao Pai ainda
mais digna de amor, porque por intermédio da cruz a humanidade se tornou uma
com Deus numa ato de supremo amor por Ele. Nós próprios consentimos nessa
entrega suprema, e no estado de ressurreição a penetração da humanidade pelo Espírito
de Deus é perfeita e assegurada por toda a eternidade. A economia total que
Deus criou para nós através de Seu Filho teve como finalidade essa perfeição
escatológica da união de Deus com toda a espécie humana.
Em Sua ressurreição, Cristo ergueu Sua inteira humanidade – alma e
corpo – a um estado de justiça e de união com Deus, numa perfeita e eterna
santidade. Esse é o estado de total submissão ao Pai. Na ascensão, a justiça de
Deus, a verdadeira glória do Pai, é comunicada ao homem. Essa glória se revela
perfeitamente por intermédio do Cristo encarnado em cada momento no qual Ele,
como homem, oferece um louvor perfeito ao Pai.
Todos os que acreditam Nele participarão dessa paz, dessa justiça,
santidade e glória, e, por intermédio do Espírito Santo, participarão das
primícias desses dons ainda no decurso de sua vida terrestre. Pois a partir do Cristo ressuscitado e
exaltado o Espírito Santo brilha de forma imediata e superabundante, exatamente
como o calor irradia de um corpo incandescente. O estado ressuscitado e
exaltado de Cristo constitui Sua humanidade plenamente preenchida e penetrada
pelo Espírito Santo, na irradiação sem obstáculos do Espírito a partir de Seu
interior. Seu corpo já não representa um obstáculo que O separa daqueles que
Nele acreditam. Ao contrário, esse corpo recebeu o poder de compartilhar
perfeitamente a Divindade com aqueles que estão unidos a ele.
Na cruz Cristo tomou a todos nós num abraço, pois Seu amor se dirige a
todos, conduzindo-nos à Sua condição de auto entrega a Deus e ao homem, a
condição na qual ele se esvaziou de Si mesmo em favor de Deus e do homem. E em
Seu amor ele nos concede o poder para superarmos a nós mesmos e a todos os
nossos impulsos egoístas.
Por meio da ressurreição Cristo combina em si a condição de vítima e o
estado de ressurreição, a plena revelação da vida divina em Sua humanidade. E para
aqueles que Nele acreditam Ele infunde essa mesma natureza combinada. São Paulo
diz: “Sem cessar e por toda parte levamos em nosso corpo a morte de Jesus, a
fim de que também a vida de Jesus se manifeste em nosso corpo. De fato, embora
estejamos vivos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus, a fim de
que também a vida de Jesus se manifeste em nossa carne mortal[30]”.
E, por sua vez, diz Santo Atanásio: “Cristo, àqueles que Lhe dão testemunho,
concede a cada um pessoalmente a vitória, tornando a morte completamente
impotente para os que mantêm sua fé e carregam em si o sinal da cruz”. Por
intermédio de Cristo temos o poder de morrer para as paixões e apetites egoístas
e de morrer para nós próprios; mas também adquirimos o poder de viver uma nova
vida, uma vida que triunfa em nós, que nasce em nosso espírito mas que também
se revela em nosso corpo. Trata-se de um poder que sabemos não provir de nós,
mas que tem sua fonte objetiva além de nós. Do Cristo ressuscitado Seu Espírito
brilha mais intensamente, dando-nos um antegozo da semelhança com Sua morte e ressurreição
e ao mesmo tempo nos conduzindo a uma perfeita semelhança com Ele.
Por meio de Sua encarnação, morte e ressurreição o Verbo de Deus encarnado
ascende por degraus a um estado no qual o Espírito Santo brilha cada vez mais
intensamente Nele. É através desse mesmo Espírito Santo que o Verbo une a si
mesmo, depois que foram separados dele e dispersos por todos os cantos, todas
as criaturas que jamais existiram, existem e existirão[31].
A Salvação, em seu estado final, de acordo com São Paulo, consiste na reunião
de todas as coisas em Cristo. Assim como o pecado consiste no egoísmo que
separa os homens de Deus e uns dos outros, a salvação consiste em superar o
egoísmo, num mútuo amor entre todos os homens e em união com Deus. Entre a
ressurreição de Cristo e a nossa própria ressurreição desenrola-se o intervalo
no qual Cristo opera para nos unir a todos em Si, e no qual nos esforçamos para
o mesmo objetivo, estimulados e sustentados por Sua atividade. Essa atividade
de Cristo é dirigida a todos os homens e opera em todos os homens de maneira mais
ou menos tangível e visível, em maior ou menor grau. Ela combate o egoísmo que
existe em todos os homens, mas não os liberta dele sem seu próprio
consentimento, e sua luta consiste em obter do homem o consentimento e a
colaboração tendo em vista sua união com Cristo.
Cristo estabeleceu em Si próprio o fundamento e assegurou o poder para
essa reunião de toda a humanidade Consigo por meio de sua encarnação, paixão,
ressurreição e ascensão, e ao enviar Seu Espírito Santo que opera secretamente
no mundo e visivelmente na Igreja. Daí por diante o Espírito de Cristo é
infundido em nós continuamente como o poder unificador de Cristo. Em relação a
isso, o Verbo, por intermédio de quem e em quem todas as coisas foram criadas
no princípio, confere uma nova orientação e integração da totalidade da criação
ao assumi-la em Si, a mesma criação que outrora abandonou a direção original
que Deus quis para ela. Cristo superou as inimizades que que apareceram entre
as criaturas quando os elementos que deveriam constituir uma criação simples e
unificada se desintegraram e se afastaram uns dos outros. Assim é que o poder
que emanou dessa unidade realizada em Cristo exerce sua influência unificadora
sobre toda a criação. Por meio de seu nascimento virginal Cristo superou a
oposição entre os sexos. Em Cristo “não existe homem ou mulher[32]”.
Por meio de sua morte e ressurreição ele desmanchou a separação entre o Paraíso
e o universo que surgiu após a Queda. Ele abriu para a humanidade a entrada
proibida do Paraíso, e veio em pessoa à terra depois de Sua ressurreição para
mostrar que Nele o Paraíso e o universo haviam se tornado uma só coisa. Através
de sua ascensão Ele uniu os céus e a terra, levantando o corpo humano que
assumira, um corpo de mesma substância e natureza que o nosso. Tendo exaltado o
corpo e a alma acima das hostes dos anjos, Ele restaurou a unidade entre os
mundos sensível e inteligível e assegurou a harmonia de toda a criação.
Assim é que foi por meio de Sua encarnação, paixão, ressurreição e
ascensão, e por meio da missão e da atividade de Seu Espírito Santo que Ele
uniu todas as coisas. Por meio de Sua encarnação o modo de união se tornou, por
assim dizer, ontológico. Com Sua morte Ele purificou todo o cosmo, e de modo
especial purificou a todos os homens como agentes conscientes do cosmo,
tornando possível a eles exercer uma atividade unificadora. Por meio de Sua ressurreição
Ele preencheu todas as coisas com o significado último de toda essa busca pela
unidade, enchendo-as de luz.
Mas a união mais essencial que Cristo buscou, e que constitui sua
contribuição decisiva para efetuar a unidade de toda a espécie humana, consiste
na união de nós com Deus e na união mútua entre todos nós. Foi com essa
finalidade que fomos criados no princípio. A fim de efetuar a união entre todos
os homens, Cristo primeiramente uniu todas as coisas criadas nos mais profundos
níveis de sua existência, e foi por intermédio dessa união que Ele trouxe a
união a todos os homens. Santo Atanásio diz: “O Senhor veio para derrubar o
demônio e para purificar o espaço, construindo para nós um caminho para os
céus, como disse o Apóstolo, ‘através de um véu, ou seja, de Sua carne [33]’
[...] e assim, ele reabriu o caminho para os céus, dizendo mais uma vez: ‘Abri
vossas portas, ó príncipes, e que elas permaneçam abertas, as portas eternas[34]’.
Pois o próprio Verbi não necessita que se abram as portas, sendo Ele o Senhor
de tudo, nem qualquer de Suas obras foi-Lhe obstada. Não, somos nós que o
necessitamos, nós a quem Ele suportou em Seu próprio corpo – esse corpo que
primeiramente Ele ofereceu à morte em favor de todos, e então, tendo feito
isso, transformou em caminho para os céus”. Vemos aqui mais uma vez o quão
estreitamente Santo Atanásio conecta a morte de Cristo com Sua ressurreição. Seu
corpo teria que morrer para se levantar outra vez, de modo que por intermédio desse
corpo reerguido e transfigurado todos nós, com nossos corpos, pudéssemos
alcançar os céus e a transfiguração. Assim é que Santo Atanásio prossegue: “Ademais,
como não foi Sua própria morte, mas a de toda a espécie humana que o Salvador
veio para cumprir, Ele não deitou Seu corpo por um ato individual de morrer,
pois para Ele, enquanto vida, isso não tinha cabimento; mas Ele aceitou a morte
pelas mãos dos homens, para dessa maneira destruí-la completamente em Seu
próprio corpo”.
Uma vez conduzidos à união com Deus pelo corpo sacrificado e reerguido
do Senhor, nós, as obras de Suas mãos, somos também levados à união entre nós. Nossos
próprios logoi e os logoi de nossas existências são atraídos
à união com o Divino Logos, o Verbo no
qual encontramos nossos arquétipos eternos e por quem nossas naturezas anseiam,
como pelas profundezas insondáveis da vida e a fonte secreta desse conhecimento
que buscamos como a essência de todas as coisas. Quando nossos desejos retornarem
à sua conformidade com seu próprio ser e com suas finalidade e estrutura racional
internas (logoi), e houverem
rejeitado as disposições arbitrárias de seu egoísmo individualista irracional e
antinatural, então seremos chamados a nos unirmos ao desejo humano de Cristo e,
através dele, ao Seu desejo divino, que é um com Seu desejo humano.
A força de atração em Cristo é o Seu amor. Esse amor se revela no ato
da encarnação e na forma de Sua vida terrena. Ela se revela mais enfaticamente
no modo de Seu sacrifício, e com mais eficácia no seu estado reerguido e
exaltado do qual o amor irradia como Espírito Santo. Todas essas maneiras de
ser, concentradas no estado reerguido de Cristo, nos atraem para a ressurreição
como o clímax da união com Ele e para conosco, fazendo uso simultâneo tanto de
nossos anseios naturais como de nosso sacrifício que é alimentado pelo Seu
sacrifício. Embora Cristo tenha ascendido, ele não obstante permanece em
contato conosco e com os mais profundos níveis do mundo por intermédio da força
de atração exercida por Seu amor. “Vede que eu estarei convosco até o fim das
eras[35]”.
Essas palavras foram ditas pelo Senhor para aqueles que foram enviados para
chamar o mundo para Ele, mostrando que Ele próprio conduziria a todos os homens
para Si por meio deles.
É uma verdade geral que o amor atrai e conecta. Ele é uma força
unificadora que nasce da razão divina e da vontade divina na qual as demais
razões e vontades têm sua origem, e no qual e através do qual todas as coisas
podem encontrar sua harmonia comum. A razão divina é a base da harmonia de
nossas razões e vontades que são unidas intimamente, e essa união se realiza
por meio do amor, assim como a união de Deus com todos os homens e desses entre
si se processa através do amor.
A união final de todos em Deus, o objetivo para o qual Cristo deseja
conduzir os homens, de acordo com São Paulo[36],
é equivalente ao Reino de Deus, o Reino do Amor. Essa é a proposta de toda a
obra de salvação de Cristo, uma obra que é inconcebível sem esse objetivo
escatológico e sem nosso esforço em direção a ele.
[1]
“Se quando éramos inimigos fomos reconciliados com Deus por meio da morte do
seu Filho, muito mais agora, já reconciliados, seremos salvos por sua vida”.
[2]
“Tudo isso vem de Deus, que nos reconciliou consigo por meio de Cristo, e nos
confiou o ministério da reconciliação. Pois era Deus quem reconciliava com ele
mesmo o mundo por meio de Cristo, não levando em conta os pecados dos homens e
colocando em nós a palavra da reconciliação. Sendo assim exercemos a função de
embaixadores em nome de Cristo, e é por meio de nós que o próprio Deus exorta
vocês. Em nome de Cristo, suplicamos: reconciliem-se com Deus”.
[3]
“Porque Deus, a Plenitude total, quis nele habitar, para, por meio dele,
reconciliar consigo todas as coisas, tanto as terrestres como as celestes,
estabelecendo a paz pelo seu sangue derramado na cruz. Antigamente vocês eram
estrangeiros e inimigos de Deus, por causa das obras más que praticavam e
pensavam. Agora, porém, com a morte que Cristo sofreu em seu corpo mortal, Deus
reconciliou vocês, para torná-los santos, sem mancha e sem reprovação diante
dele”.
[4]
“Cristo é a nossa paz. De dois povos, ele fez um só. Na sua carne derrubou o
muro da separação: o ódio. Aboliu a Lei dos mandamentos e preceitos. Ele quis,
a partir do judeu e do pagão, criar em si mesmo um homem novo, estabelecendo a
paz. Quis reconciliá-los com Deus num só corpo, por meio da cruz; foi nela que
Cristo matou o ódio. Ele veio anunciar a paz a vocês que estavam longe, e a paz
para aqueles que estavam perto. Por meio de Cristo, podemos, uns e outros,
apresentar-nos diante do Pai, num só Espírito.”.
[5]
“Cristo nos resgatou da maldição da Lei, tornando-se ele próprio maldição por
nós, como diz a Escritura: ‘Maldito seja todo aquele que for suspenso no
madeiro’.” (Gálatas 3: 13). “Quando, porém, chegou a plenitude do tempo, Deus
enviou o seu Filho. Ele nasceu de uma mulher, submetido à Lei para resgatar
aqueles que estavam submetidos à Lei, a fim de que fôssemos adotados como
filhos”. (Gálatas 4: 4-5).
[6]
João 14: 20-23; 15: 1-9; Gálatas 2: 19-20; Efésios 3: 17.
[7]
Gálatas 4: 4; Romanos 8: 15.
[8]
Gálatas 4: 19.
[9]
Efésios 3: 6.
[10] I
João 1: 3; I Coríntios 1: 9.
[11]
II Coríntios 13: 14; Filipenses 2: 1.
[12]
Romanos 8: 14, 19; 9: 26; Gálatas 4: 6-7; Hebreus 2: 10, etc.
[13]
II Pedro 1: 4.
[14] I
Pedro 1: 4.
[15] I
Pedro 3: 18.
[16]
Tiago 5: 16.
[17]
Apocalipse 22: 11.
[18]
Mateus 6: 1.
[19]
II Coríntios 1: 22; Efésios 1: 14.
[20]
Efésios 4: 13.
[21]
Do latim vicarius, o que faz as vezes
de outro, substituto.
[22]
João 17: 19.
[23]
Efésios 3: 17-19.
[24] Efésios
2: 18.
[25]
Efésios 2: 16.
[26]
Gálatas 4: 19.
[27]
Romanos 6: 3-5.
[28]
Efésios 2: 16-18.
[29]
II Coríntios 5: 15, 17.
[30]
II Coríntios 4: 10-11.
[31] Efésios
1: 10; Colossenses 1: 16.
[32]
Gálatas 3: 28.
[33]
Hebreus 10: 20.
[34] Salmo
23: 7.
[35]
Mateus 28: 20.
[36]
Efésios 1: 10; Colossenses 1: 16-20.
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