quarta-feira, 18 de junho de 2014

Filocalia Tomo II Volume 2 - Gregório o Sinaíta: Outros capítulos

GREGÓRIO O SINAÍTA


OUTROS CAPÍTULOS


1. Todos os que foram batizados em Cristo devem passar por todos os estágios da vida de Cristo. Por que receberam seu poder. E, por meio dos mandamentos, eles podem descobri-lo e aprende-lo. A concepção é a garantia do Espírito. O nascimento é a energia da alegria. O batismo é o poder purificador do fogo do Espírito. A transfiguração é a contemplação da luz divina. A crucificação é a morte para o mundo. O enterro é a guarda do amor divino no coração. A ressurreição é o despertar vivificante da alma. A ascensão é o êxtase em direção a Deus e o arrebatamento do intelecto. Quem não descobriu nem sentiu a passagem por estes estados ainda é uma criança em seu corpo e em seu espírito, ainda que diante de todos pareça um homem entrado em anos e cheio de ações.

2. A paixão de Cristo traz em si uma morte que dá a vida, por aqueles que sofrem apesar de todos, uma vez que sofremos com ele para sermos glorificados com ele[1]. Mas as paixões e os prazeres arrastam os que por eles se entregam a uma morte que traz a morte. Sofrer voluntariamente os sofrimentos de Cristo consiste, de fato, em crucificar a crucificação e em fazer morrer a própria morte.

3. Sofrer por Cristo consiste em suportar o que acontece. Pois a instrução do Senhor, que é um ardor ciumento pelo bem dos inocentes, nos denuncia para que retornemos, abrindo os ouvidos, a nós que somos culpados. É por isso que o Senhor prometeu a coroa da eternidade àqueles que suportam. Glória ao nosso Deus, glória a ti, Trindade santa, por tudo, glória a ti.

Da transformação passional

4. A acídia, paixão difícil de combater, afrouxa o corpo. E quando o corpo está relaxado, também a alma fica frouxa. Esgotados um e outra, a compleição do corpo é alterada pela preguiça. Esta suscita o desejo; o desejo, o calor; o calor, a rebeldia; a rebeldia suscita a memória; a memória, a imaginação; a imaginação, a sugestão; a sugestão, a associação; a associação, o consentimento; e o consentimento cria o ato, seja por meio do corpo, seja por meio de outras aberrações. Assim o homem é vencido e tomba.

Da boa transformação

5. A paciência em todas as obras engendra a coragem; a coragem, a resolução; a resolução, a constância; a constância, a tensão; a tensão do trabalho, ou a superação, acalma a intemperança do corpo e domina o relaxamento do desejo; o desejo suscita a aspiração; esta, o amor; o amor suscita o ardor; o ardor, o calor; o calor, o despertar; o despertar, o esforço; o esforço, a prece; a prece, a hesíquia; a hesíquia engendra a contemplação, e esta o conhecimento; o conhecimento engendra a inteligência dos mistérios; o fim dos mistérios é a teologia; o fruto da teologia é a perfeita caridade; o fruto da caridade é a humildade; o fruto da humildade é a impassibilidade; o fruto da impassibilidade é a vidência, a profecia, a previsão. Pois aqui em baixo ninguém é perfeito em virtudes, nem absorve de uma vez por todas todos os vícios. Mas quando a virtude cresce pouco a pouco, o vício retorna insensivelmente para o nada.

Das tentações durante o sono

6. Questão: quando a polução noturna é pecado, e quando não?
    Resposta: a polução é pecado em três situações: a prostituição, a frouxidão e o consentimento dos pensamentos. Mas em sete casos ela não é pecado: quando o fluxo provém da urina, dos alimentos materiais, dos alimentos purgativos, da água fria, do relaxamento do corpo, da fadiga extrema e das diversas imaginações demoníacas. Dentre os ativos, depois da velhice, o fluxo ocorre no mais das vezes por cinco dos modos mencionados. Mas entre os impassíveis, a matéria do humor não vem senão com a urina. As numerosas penas e a energia divina que purifica e santifica sutilizaram as passagens secretas. Ademais, eles receberam os carismas da temperança. O último modo – o fluxo que provém dos fantasmas durante o sono – é o dos passionais e dos enfermos. Mas também este, na medida em que é involuntário, não é um pecado. É o que disseram os Padres.

No impassível, o movimento que não é pecado e que a providência suscita de tempos em tempos, é consumido pelo fogo divino como o resto da matéria. No ativo, a necessidade é múltipla, e nada do que sai do corpo é condenável. No passional, o fluxo é duplo. Ele pode ser mau ou não. Ele pode ser provocado durante o sono pelos fantasmas, ou na vigília pelo consentimento. O primeiro modo não é condenável; mas o segundo é pecado, e a ele esta ligada uma pena.

Nos impassíveis, o fluxo e o alívio do corpo são a mesma coisa. O humor se vai com a urina, segundo os caminhos da providência. A urina se espalha como um resíduo e o humor se perde, consumido pelo fogo divino. É o que se diz. Nos ativos e nos médios, diz-se que o corpo se purifica e se libera do humor corruptível e daquilo que é natural e necessário, por seis modos gerais e irrepreensíveis do fluxo: os alimentos materiais, os alimentos purgativos, a água fria, o relaxamento da natureza, o esgotamento pelo trabalho e por fim a natureza afetada por si mesma sob a influência da inveja dos demônios. Entre os doentes e os noviços, os modos passionais são também em número de seis: a gula, o falatório, o excesso, a vanglória, o duplo consentimento da imaginação e a inveja agressiva dos demônios. Mas este é o objetivo da providência: purificar a natureza da corrupção, dos acréscimos estrangeiros e dos desejos selvagens que penetram nela, e, por meio da atenção, ensinar àquele que combate a humildade e a temperança em tudo[2] e longe de tudo.

7. Aquele que vive só e que come o que lhe é dado por caridade, deve receber a esmola de sete maneiras: a primeira, pedir quando necessário; a segunda, receber quando necessário; a terceira, receber o que vem como se fosse dado por Deus; a quarta, ter confiança em Deus, crer que é ele quem retribui; a quinta, ser um operário dos mandamentos; a sexta, não transgredir nenhum deles; a sétima, não ser avaro, mas generoso e compassivo. Quem age assim se alegra: este é conduzido por Deus, não pelos homens.



[1] Cf. Romanos 8: 17.
[2] Cf. I Coríntios 9: 25.

Nenhum comentário:

Postar um comentário